Neste dia 28 de fevereiro, dia de aniversário de Carlos Castán, o moderador da Mesa, João Gobern, pediu a todos os presentes no Cine-Teatro Garrett que cantassem os parabéns ao escritor. O músico Mário João Alves (conhecido pelo projeto Vozes da Rádio) foi convidado a dirigir o coro. Um momento descontraído proporcionado, como é habitual, pela caraterística de amizade intimista do Encontro de Escritores da Póvoa de Varzim.

O jornalista João Gobern iniciou a apresentação do tema desta Mesa, referindo que “a literatura passa pelo combate ao vazio” e não resistiu a colocar o dedo na ferida relativamente ao momento que a sua “classe profissional atravessa em Portugal”.

“Não posso deixar de lamentar que, hoje, o vazio tenha muito mais espaço nos órgãos de Comunicação Social do que propriamente a memória. A memória responsabiliza-nos uns perante os outros e, se calhar, estamos numa fase em que a responsabilidade não é um valor muito bem visto. E é importante não esquecer que a memória é a única forma inteligente e segura de prepararmos o nosso futuro e isso talvez não interesse a alguma gente com demasiado poder. Ao contrário do que acontece com os autores – e os autores serão obviamente prejudicados pelo vazio – parece-me que, numa fase em que algum jornalismo não está numa altura de nos encher propriamente as medidas, é um muito bom momento para nos virarmos com mais atenção para a literatura. Os próprios autores prezam a memória de uma maneira que, nesta altura, é muito mais livre, menos condicionada, do que propriamente a rapaziada da minha classe”, alertou João Gobern.

Os autores optaram por apresentar de forma muito pessoal este tema proposto pela Mesa 6. Mário João Alves aliou a sua faceta de músico à de escritor e foi discorrendo sobre a importância da vida, à medida que ia citando temas musicais desde Avicci (uma das bandas que o filho adolescente ouve) a John Lennon ou até mesmo ao popular “Malhão, malhão”, que lança a interrogação “Que vida é a tua?”…

Uberto Stabile apresentou uma comunicação que parte da memória do mês de julho de 1969, altura em que celebrou o seu 10º aniversário, na companhia da família, aludindo também ao vazio que surge em certos momentos das nossas vidas, por vezes, provoado pelas memórias que nos ficaram gravadas para sempre dos tempos de infância. Terminou abordando a literatura e a pluralidade da poesia, concluindo que há algo que une estes três momentos desde a memória, passando pelo vazio e terminando na literatura: o amor.

“Não há amor sem memória; não há amor que não provoque um vazio; não há literatura sem amor”, afirmou Stabile.

Cláudia Clemente contou que, quando começou a escrever sobre o tema proposto pelo certame, o que lhe saiu foi um conto. Voltou à escrita, voltou a sair-lhe um conto. Então, resolveu trazer um conto para ler – a história de uma visita a um cemitério de Paris. Sendo apreciadora de cemitérios desde muito nova, era inevitável…

Carlos Castán, depois de ter ouvido os Parabéns por tanta gente, afirmou-se rendido com tudo o que diz respeito ao Correntes d’Escritas. O escritor explicou que o tema tem correspondência com muitas das obsessões que o ocuparam no seu último livro “Má Luz” (que apresentou a seguir, às 12h00, na sala de atos do Cine-Teatro Garrett).

Carlos Castán aproveitou para ler alguns trechos da obra sublinhando que “vazio e memória são palavras irmãs”.

Por fim, Renato Filipe Cardoso apresentou uma performance poética. Começou com o “Poema da minha vida” – “Serei breve”.

E deu início à performance, a confeção de uma refeição, pois já dizia Natália Correia: “a poesia é para comer”…

“Vamos lá”…alguidar em cima da mesa e Renato Filipe Cardoso começou a colocar os ingredientes. Primeiro ingrediente – a literatura – o autor colocou uma revista pornográfica. A seguir como tempero – a crítica literária – colocou um Jornal de Letras.

O segundo ingrediente – o vazio – nada mais, nada menos, que um bife do vazio, que, revelou o escritor, custou 16,48€ o quilo: “o vazio está pela hora da morte”.

Foi colocado no alguidar o terceiro ingrediente – a memória – uma foto de um cérebro, uma foto de um lobo (o lobo cerebral) e um frasco de Memofante.

Enquanto se mexia o preparado, Renato Filipe Cardoso foi lendo diversos poemas também como forma adicional de temperar a receita. E pronto o cozinhado, o que restou da literatura, vazio e memória foi…uma flor!

Para a conclusão da apresentação, o autor leu o seu segundo poema intitulado “Lápide” e que diz: “Eu bem disse que estava doente”.