A tradição oral tinha um papel central na transmissão das crenças e superstições. Para perpetuar a memória desta cultura popular, o Museu Municipal vai organizar uma sessão que conta com a participação de Maria do Desterro, “Tia Desterra”, uma genuína “Contadora de Histórias”. À volta da lareira, na cozinha tradicional do “Solar dos Carneiros” (Museu) os presentes vão certamente ficar presos à narração apaixonada que vai dar “vida” a abentesmas, almas penadas, corredores, bruxas e coisas ruins.

Santos Graça no seu livro “O Poveiro”, editado em 1932, faz-nos um relato tocante da alma dos nossos pescadores, a quem as agruras do mar aguçam a consciência da precaridade da vida. Homens e mulheres simples, no seu íntimo não há qualquer conflito entre a vivência sincera da sua fé em Cristo e a crença numa panóplia de entidades, boas e más, que regem o seu dia-a-dia. O relato de Santos Graça aproxima-nos quase em primeira mão deste imaginário, dando-nos conta da “ingenuidade encantadora” com que uma comunidade perceciona a condição humana face às “forças superiores”.

Não ouves que bateu a meia-noite? Apaga a luz; não despertes quem vagueia pelas ruas. Silencio! Chegou a hora deles: são aventesmas, sombras, bruxas, corredores, almas penadas, espíritos malignos, os diabos; tudo vagueia, nesta hora fatídica por essas ruas e vielas sem luz! Se careces de sair à rua, acautela-te: leva um espelho, uma cruz, um rosário.” Cf. Santos Graça, 1932.