Uberto Stabile iniciou a sua intervenção confessando que os títulos dos temas são, a cada ano que passa, mais complicados. Para o valenciano “todas as escolhas implicam uma renúncia. Quando escolhemos, perdemos ou ganhamos”. Segundo o escritor, “somos como uma obra sem prólogo”. Stabile acrescentou que “os nossos atos mudam o mundo. A sede de conhecimento pode mudar o futuro dos seres. Já por isso dizem que a curiosidade matou o gato”.

“Arrependemo-nos pelas escolhas que não fizemos, pelo que deixamos de viver ou conhecer, do que teria sido. Escolher compromete-nos sempre. Nós mudamos a vida e a vida muda-nos”, disse Uberto Stabile. Para o escritor, há livros que nos mudam a vida e situações na vida que mudam a forma de escrever ou ler livros. “A vida escreve-se de uma vez só e nunca se passa a limpo”.

Para Filipa Leal, escolher é das mais injustas tarefas a que estamos expostos. “Não tenhamos ilusões: escrevemos sempre depois dos outros. Escrever é um atrevimento. E viver também o é. Escolher mudar é o mais difícil. Aprendi isto muito cedo. Quando escolhemos, mudamos”. A escritora explicou que estima-se que Hitler teria mais de 16000 livros na sua biblioteca. “Hitler queimou livros, pessoas. Estamos perante o caso raro de um leitor que escolheu mudar todos os livros que se viria a ler depois sobre o horror provocado por si”.

Filipa Leal disse que “ao destino agrada-lhe as repetições. Se somos leitores pudemos mudar o livro sim. Quando escolhemos mudar o livro nem sempre mudamos a trama, as pessoas. Se o leitor é também escritor poderá escolher mudar o livro que leu no seu livro seguinte. Não falo de plágio, claro. Mudar as regras de jogo de referências. Um escritor também é leitor da sua obra, pelo menos durante o processo de escrita”.

A escritora afirmou que “perante a pedra no meio do caminho temos várias opções, mas a mais comum será escolher não ver a pedra. O que está em jogo não é o nosso futuro, mas o futuro da pedra. Cada um escolherá em liberdade o que fará à pedra.

Ana Zanatti, que lançou esta manhã O sexo inútil, leu um texto poético a que intitulou “A escolha”. Para a escritora e atriz, os “políticos têm discursos obscuros e espremem-lhe o coração. No telejornal, os jornalistas falam apenas de factos. A minha cabeça é uma rotunda em hora de ponta. Às vezes tenho saudades do tempo de berço. Tempos remotos em que recebia instruções para ser a menina perfeita. Claro que não fui. Quero continuar a imaginar uma data de palermices sobre a liberdade”.

O escritor de literatura infantil e ator, João Ricardo, confessou estar nervoso por ser a primeira vez que intervinha num evento como o Correntes d’Escritas. João Ricardo tinha um discurso já programado e hoje “decidi mudar-me a mim próprio e rasgar tudo. Estou nervoso porque não é escritor quem quer, é escritor quem pode”. João Ricardo disse estar a completar uma pós-graduação sobre literatura infantil e é esse caminho que tem seguido. O seu primeiro livro Queres namorar comigo? É dedicado ao seu filho Rodrigo, que castigou por uma asneira e que perguntou ao pai passado algum tempo “Já chega? Estás a fazer-me dói-dói no coração”.

João Ricardo falou sobre a sua experiência enquanto encenador, nomeadamente das peças infantis “Sonho de uma noite de Verão” e “A Ilha Encantada”, baseadas nas obras de Shakespeare e adaptadas por Hélia Correia. O encenador afirmou que pretende concluir a trilogia com a adaptação da tragédia Mcbeth. “São três peças que refletem sobre a realidade humana e sobre a própria vida: o amor e o sonho, a dor e a vingança”. 

“A mudança para mim é isto: a importância que eu tenho é a importância que tu me dás. Eu estou aqui porque eu me dei importância a mim mesmo. Não é um ato narcísico. Gosto muito de mim. No mundo há dois tipos de pessoas: os imbecis e os inteligentes. Todos vão parar ao mesmo lugar: à cova”, concluiu João Ricardo.

Para Andrés Barba “o título da Mesa é enigmático e isso dá-nos a possibilidade de falarmos sobre qualquer coisa”. Para o escritor, “a escolha dos títulos dos seus livros fica sempre para o final. Na escola, os professores perguntam-nos “de que se trata este livro?” e nós sentimos que é impossível responder apenas numa frase. É o que sinto em relação aos títulos dos livros. É difícil porque estarei a resumir, a dizer do que tratei e quase nunca sei as inquietudes que me levaram a escrever”

“O riso foi um tema que sempre me fascinou. Na presença de um palhaço parecia-me um título um excelente título e foi a primeira vez que pensei no título antes de escrever o livro. Roubei-o a Ingmar Bergman. Interessava-me explorar o que pode acontecer na presença de um palhaço e o que muda na nossa perceção do mundo. Decidi escrever sobre um célebre comediante já reformado que empreendeu uma campanha política que elegesse um manequim para o Congresso, como forma de desmascarar o teatro político que nos subjuga”.

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