Mas, José Carlos Vasconcelos insistiu, já que “era cativante mostrar um olhar diferente sobre as coisas. Laborinho Lúcio é um homem interessado na cultura e apaixonado pela literatura. Quase ninguém sabe, mas é também um óptimo bailarino”, brincou o jornalista na apresentação do conferencista.

“E agora, José?” Foi com este verso, de um poema de Drummond de Andrade, que Álvaro Laborinho Lúcio iniciou a Conferência de Abertura do Correntes d’Escritas. O Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, Jubilado, confessou que tinha medo que a dúvida “Porque o convidaram?” assaltasse a plateia no final da conferência, e não no início. Informou que a sua exposição iria demorar 30 minutos e pediu “na audição, paciência, na avaliação, benevolência”.

“Prefácio”. Foi este o título escolhido por Laborinho Lúcio. “Não gosto de prefácios, fazem-me lembrar buracos de fechadura. E eu não gosto de espreitadelas. Espreitar é retirar privacidade.” Mas, quanto a espreitar, o conferencista tem outra opinião: “É mais nobre. É querer pertencer. Como num livro, que é coisa privada. Não as palavras, mas aquele não escrito que nos transforma”, continuou. No entanto, Laborinho Lúcio expôs a sua “expectativa ingénua de também me tornar cúmplice nestas Correntes d’Escritas e não me ficar apenas por uma espreitadela”.

Ao longo da conferência, que no final afirmou ser “sobre nada”, o convidado reflectiu sobre todos os temas das mesas de debate, frases de poemas concorrentes ao Prémio Literário Casino da Póvoa: “Falta futuro a quem tem no presente ambições/ passadas”, “Eu começo depois da escrita”, “A minha arte é uma espécie de pacto”, “Nua de símbolos e alusões é a poesia”, “As palavras são apenas uma memória”, “Espalho sobre a página a tinta do passado”, “A obra que faço é minha”, “Não há palavras exactas”, “Nada no mundo deve ser subestimado” e “Para lá deste lugar, ninguém diz as palavras”. Mas, além destas frases, Laborinho Lúcio citou inúmeros escritores, tais como, Conceição Lima, Ana Luísa Amaral, Humberto Eco, Nuno Júdice e muitos outros.

Desculpando-se por “fugir à linha de raciocínio”, Laborinho Lúcio contou que todos os dias “sendo da Nazaré, apanhava o transporte para Alcobaça, conhecido como o autocarro de Torres Vedras. E, se a minha professora me mandasse fazer uma composição sobre utopia, eu escreveria: Torres Vedras! A utopia só existe porque saímos cedo demais. Hoje, pelo cheiro, pelos olhares, pelos passageiros, pelas cumplicidades, estou nas Correntes d’Escritas, no autocarro para Torres Vedras”.

Terminou, afirmando: “E pronto. Chega de tentar espreitar. Aqui fica o que deveria ter sido uma fala corrida, apenas para dar início ao Encontro, algo informal, coisa pouca, um prefácio.”