O professor e investigador da história local tem vindo a dedicar-se ao estudo sobre a aparição da Santa Cruz no Calvário e deparou-se, por acaso, com alguns documentos que retratam a vivência do Cisma em Terroso e Rates, freguesias onde se registaram maiores tumultos devido à resistência popular. Lendo os documentos, José Ferreira considerou interessante realizar um breve apontamento sobre o tema, até porque não conhece qualquer outro estudo sobre este assunto a nível local. 

Foi com entusiasmo que José Ferreira abordou um período da História local bem conturbado, resultante do facto de os Liberais terem expulsado o núncio apostólico cortando relações com a Santa Sé. Entre 1838 e 1842, o país mergulhou num Cisma, “ficando todo e qualquer paroquiano obrigado a fazer declarações de todos os factos de todos os eclesiásticos de que se possa provar desafeição ao governo legítimo que actualmente nos rege, debaixo de pena de excomunhão”.

José Ferreira foi mostrando documentos que provam o ambiente de “verdadeira Inquisição” que se vivia durante o Cisma liberal (em que os padres eram nomeados de acordo com a simpatia do poder instituído) e que provam as circunstâncias de expulsão e substituição de diversos párocos, como os das freguesias de Amorim, Bagunte, Póvoa de Varzim e Touguinhó, a destituição de diversos regedores em Terroso e Rates, a caça aos padres falperristas (aqueles que obedeciam a uma “nomeação legítima”) e as ações de recusa dos populares, o mesmo é dizer, a celebração de eucaristias, batismos e outros atos religiosos em casas ou capelas particulares. O povo negava-se a celebrar cerimónias religiosas sob a alçada de “párocos nomeados pelo vigário capitular intruso”.

Foram apresentados na sessão registos documentais de uma ordem para prender o regedor de Rates acusado de “crime de cisma” ou da queixa apresentada ao administrador geral do Porto de ter sido sepultada uma criança em Rates sem a presença de um pároco. José Ferreira mostrou também os ofícios a darem conta do envio de forças militares para Terroso, onde ficaram “hospedadas” em casa de cismáticos, até que outro documento dá conta de que, em junho de 1839, “a tropa muda-se de Terroso para Rates”, como referiu José Ferreira, havendo mesmo o registo de um preso.

O professor terminou a sessão com um documento datado de 15 de junho de 1841, que determinava o fim do Cisma liberal, mas, na sua opinião, o problema “não foi devidamente sanado”, revelando o investigador que, mesmo depois de terminado oficialmente, continuavam a ser promovidos a cargos de grande responsabilidade eclesiásticos cismáticos.

Do estudo efetuado a este período histórico, José Ferreira deixa a convicção de que muito havia ainda a desvendar e a certeza de que “devia ser um verdadeiro terror viver naquela época do Cisma, em Terroso e Rates, principalmente, pois as pessoas estavam sempre sujeitas a verem armas pela frente e a terem as suas casas revistadas pelas tropas”.