O concerto decorreu na Igreja Matriz da Póvoa de Varzim, com lotação esgotada e perante um público absolutamente galvanizado, que no fim não escondia o seu entusiasmo. As ‘Vésperas’ de Claudio Monteverdi ainda não tinham sido trazidas ao FIMPV e a estreia de uma das mais espectaculares obras-primas da primeira fase do barroco na programação do evento constituiu mais um importante degrau na sua consolidação.

Mas não se pense que este excecional concerto do FIMPV 2016 foi um momento único. Aliás toda a programação se pautou por uma qualidade artística de elevado nível, a começar pelos restantes espetáculos dedicados à música antiga: o concerto por La Grande Chapelle dirigida pelo musicólogo Albert Recasens (música ibérica do século XVII), o quarteto vocal The Orlando Consort (música inglesa dos séculos XI a XIV), o agrupamento galego Resonet (cantigas de trovadores galaico-portugueses – o concerto também serviu de pretexto para a apresentação pública do CD gravado em S. Pedro de Rates, meses antes), o Coro Gulbenkian dirigido por Michel Corboz (motetes de Johann Sebastian Bach) e o violoncelista Pavel Gomziakov (suites de Bach (e também de Britten).

A música de câmara dedicada a outros períodos históricos continua a ser uma feliz aposta do FIMPV. O concerto do clarinetista Carlos Alves e do seu Arte Music Ensemble (todos eles elementos destacados de formações sediadas na Casa da Música do Porto) foi outro concerto de excepção, com duas obras-primas de Mozart e de Brahms justamente aplaudidas pelo público. Por sua vez, o Quarteto Verazin continua a brindar-nos com a sua exploração do repertório clássico e do século XX; mas a surpresa deste ano foi a ‘Serenata italiana’ de Hugo Wolf, obra leve e de uma elegância íntima primorosamente executada. Ainda no que concerne a jovens instrumentistas que o FIMPV revela todos os anos, coube a vez ao violetista portuense Lourenço Macedo Sampaio – o ‘Jovem Músico do Ano’ do Prémio ‘Jovens Músicos’ da RTP Antena 2 (2015) que, desde os seus 5 ou 6 anos de idade nos habituáramos a ver entre o nosso público (ele próprio deixou registado que «[…] é uma honra participar num evento em que cresci a assistir desde, salvo erro, 1997». A sua prestação foi de qualidade, sendo de sublinhar a interpretação da versão para violeta da Sonata op. 19 de Rachmaninov (só para mencionar apenas uma obra), com a cumplicidade da pianista Olga Vasilyeva. A estreia no FIMPV do Quatuor Zaïde, formação francesa detentora de valiosos prémios internacionais, veio confirmar o seu alto gabarito. As jovens instrumentistas impressionaram pela sua beleza sonora (tocaram em valiosos  instrumentos históricos) e interpretações empenhadas e contagiantes (a sua versão do primeiro andamento do Quarteto op. 80 de Mendelssohn disso foi uma prova evidente).

Resta registar à parte os dois concertos protagonizados pelo Remix Ensemble e pela Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música. O programa do primeiro integrava a final do 9º Concurso Internacional de Composição da Póvoa de Varzim, com a estreia das duas obras finalistas dos compositores seleccionados pelo júri: Jeremías Iturra (1º Prémio) e Francisco Andreo Gázquez (2º Prémio). O público presente atribuiu a sua preferência pela mesma ordem, por larga maioria. De facto, a obra do compositor de origem chilena tem um impacto imediato muito forte e variedade tímbrica e rítmica que a tornam deveras apelativa. A primeira parte do concerto terminou com outra estreia – a da obra encomendada pelo FIMPV à compositora Sara Carvalho, docente da Universidade de Aveiro e Presidente do Júri do Concurso. A obra evoca um poema de Sophia de Mello Breyner Andresen: o material musical reflecte eficazmente oposições que ‘coabitam dentro de um mesmo espaço’ – timbres, ritmos e movimentos.

A atuação da Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música sofreu uma substituição forçada do maestro Dmitri Liss que adoeceu a caminho de Portugal, impossibilitando-o de prestar a sua colaboração em tempo útil. O jovem maestro Roberto Forés-Veses acorreu à chamada e conquistou de imediato a admiração da Orquestra e a atenção do público. O pianista Boris Berezovsky era evidentemente a grande estrela da noite – na sua terceira visita ao FIMPV, o grande artista russo demonstrou por que é hoje considerado um dos músicos mais completos da sua geração. O concerto para piano e orquestra de Edvard Grieg surgiu em toda a sua magnitude – beleza melódica, exuberantes harmonias e intervenções pianísticas ora delicadas, ora virtuosísticas, mercê do impressionante domínio técnico de Berezovsky (dando a ilusão de que tudo é fácil) e da musicalidade extrema que transparece em cada compasso. Um pianista assombroso!

A conferência de Rui Vieira Nery iniciou a programação nuclear do FIMPV, a 5 de Julho. O musicólogo desenvolveu o tema ‘Poder e Contrapoder na História da Música’ com o sempre espantoso poder de comunicação a que nos habituou.

São as impressões mais imediatas e relevantes no que diz respeito à programação. A marcação prévia de lugares em todos os recintos e a legendagem de textos cantados em tempo real continuam a merecer elogios do público. Em destaque também, a qualidade da brochura do FIMPV 2016, cujas notas ao programa e tradução de textos poéticos pelo musicólogo José Luís Borges Coelho mereceram os mais diversos elogios.

Realizaram-se as diversas Manifestações Paralelas à programação nuclear. Além das masterclasses, concertos informais pelo Coral Ensaio e por alunos e professores da Escola de Música da Póvoa de Varzim, bem como pelos premiados do Concurso de Piano 2016, diversas exposições ficam a assinalar a edição: de sublinhar as dedicadas ao FIMPV («O Festival Internacional de Música da Póvoa de Varzim – uma retrospectiva documental» e «À Descoberta do Património Musical»).

O FIMPV continua a beneficiar dos apoios estruturantes da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, da Direcção-Geral das Artes, do Turismo de Portugal, de diversas instituições e empresas (ao abrigo da Lei do Mecenato) e de meios da comunicação social, incluindo a RTP Antena 2 que, do estúdio instalado numa das dependências da Igreja Matriz, transmitiu em directo parte do programa da tarde de 8 de Julho e o concerto por La Grande Chapelle, horas mais tarde; no dia seguinte, a transmissão em directo para todo o país do concerto por The Orlando Consort teve lugar na Igreja Românica de S. Pedro de Rates.

Como vem sendo habitual, fica a dever-se ao empenho e dedicação da equipa administrativa e logística boa parte do êxito do FIMPV 2016 junto dos artistas convidados e do público.

Resumindo, já pode afirmar-se com segurança que esta foi uma das edições mais conseguidas do historial do FIMPV, atendendo a diversos parâmetros: recintos com lotação esgotada em 9 espectáculos; média de ocupação dos recintos de 99,94%; média de 242 pessoas para 13 espectáculos realizados (total de 3.151 pessoas); 8 espetáculos excecionais em termos absolutos; e uma ‘boa imprensa’ refletida em diversas críticas laudatórias publicadas em jornais de expressão nacional. 

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