No âmbito do 21º Correntes d’Escritas, na Póvoa de Varzim, não podia deixar de ser apresentado o 1º número da Lote, lançado em outubro de 2019, como que à espera deste encontro de escritores para abrir as suas páginas aos leitores.

Uma espécie de “contaciclo” desta geração de ‘millennials’ a que pertencem os fundadores e diretores: Maria Brás Ferreira, André Osório e Tomás Gorjão. Um grupo de jovens, com idades entre os 21 e 22 anos, está a apostar na publicação de poesia em livro, uma espécie de “revolução”, mas que para Maria faz todo o sentido. Veja-se que “na escrita poética há sempre qualquer coisa de irreverente”…

Seria mais lógico estes jovens dedicarem-se a publicar poemas numa revista online, mas Maria Brás Pereira contrapôs que, apesar de ser um meio mais barato que o papel e que chega a mais pessoas, o certo é que “o envolvimento com a obra não seria tanto” como acontece com o livro.

A autora afirmou que o “leitor virtual cruza-se com a poesia, não a busca”. O leitor depara-se com a poesia, a par de outros conteúdos mais informativos com que é bombardeado a todo o momento  na internet.

Maria acrescentou que este lote de diretores ‘millennials’ da Lote poderá estar “a ir contra o nosso contexto”, mas a verdade, frisou a jovem, é que “estamos a ir de encontro à poesia, para além de que, se não fosse este formato físico, não teríamos conhecido não sei quantas pessoas, haveria uma data de contactos que não se teriam estabelecido de maneira nenhuma – acho que a poesia é isso, uma espécie de luta corpo contra corpo”. Ao que Renato Filipe Cardoso, condutor desta conversa a dois, concluiu: “é um bom “’wrestling’ poético”.

O gosto pela poesia vem desde os tempos de liceu, desde que os três amigos cruzavam os corredores do Colégio Moderno, em Lisboa. E a ideia foi amadurecendo. Nos últimos dois anos, o projeto foi sendo acalentado pelos três, preparado, quer na parte poética, quer na parte mais prosaica do projeto – o juntar dinheiro para publicar uma revista de 80 páginas de poesia, emoldurada por uma capa a cores. Por isso, a Lote é anual.

A Lote não tem um estilo padronizado, aliás, apresenta, de acordo com Maria Brás Pereira, uma liberdade e diversidade muito grandes no que respeita a textos e estilos, até ao nível de línguas. A Lote inclui alguns poemas em inglês. A diversidade é palavra de ordem e os diretores não conseguiram encontrar motivos para impor barreiras à inclusão de poemas escritos em inglês – “se o autor os criou (os poemas) em inglês, toda a ideia e escrita poética nasceu naquela base linguística e considerámos que não devíamos colocar obstáculos”.

Além dos poemas dos três diretores, são publicados na Lote textos de outros autores: António Hess, Nuno, Diogo Soares. O prefácio é de Vasco Santos, psicanalista e fundador das editoras Fenda e VS. O design foi criado por Nádia Alexandre (capa) e Ricardo Marques (design editorial).

Logo de seguida, saem da mesa os protagonistas da apresentação da Lote – que pode ser encontrada na Feira do Livro do Correntes d’Escritas e, mais próximo, no Porto, na Flâneur e na Poetria -, para se sentarem Francisco Guedes (moderador) e os autores dos três pequenos livros editados por Rui Magalhães, num conjunto que se distingue pela cor, tamanho, qualidade do papel e da encadernação: Abel Neves, João Gesta e Pedro Sobrado.

Como os próprios autores explicaram estes livrinhos de bolso são apetecíveis, que “até apetece comer”, disse Abel Neves referindo-se precisamente à qualidade das publicações em termos físicos. No que respeita à edição, todos reverenciaram Rui Magalhães, “um gentleman” como o apelidou João Gesta, ou “aquele editor que diz que não é editor, mas que edita…”, como o apontou Abel Neves.

Pedro Sobrado começou por dizer que sempre pensou que seria confrangedor ver um livro seu ser vendido a 3 euros naquelas bancas de liquidação junto ao metro, mas com este livro não há risco de que isso aconteça, porque ele já está a custar 3 euros desde o início…

De facto, Francisco Guedes terminou a apresentação aludindo exatamente ao preço dos três livros, “inferior a um maço de tabaco, por isso, fumem estes livros!”

A Caixa “12 Catorze” contém os três livros: “A foca não corta o queijo” de João Gesta; “Quase Nada – Defesa e interpretação de Robert Walser” de Pedro Sobrado; “Vistas Aéreas” de Abel Neves.

A ideia de publicar estes livros foi a parte final de algo muito mais simples: um encontro de amigos num fim de semana. No final, houve alguém que escreveu um pequeno livro para oferecer às quatro pessoas que tinham estado nesse encontro, só depois surgiu a ideia de o transformar num livro para todo o público, ou melhor, em três livros.

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