Na declaração de voto do júri pode ler-se: “obra revela um carácter monumental, impressionante pelo seu fôlego e constante equilíbrio de espessura poética”.

São quase quinhentas páginas, cada uma com seu poema, que nos são dadas a ler na última obra de Fernando Echevarria (Porto, Afrontamento, 2013).

Sinopse

É LISO O MAR. O SOL ESPELHA A SUA
superfície de luz. Ao fundo, espesso,
o cômputo plausível da negrura
só deixa adivinhar a paz do peso.
E, entre os dois, apenas a recusa
a do brilho espelhado. Verdadeiro
por acima lhe vir realidade alguma,
a não ser a extensão do mar imenso.
Poema da pág. 365

Fernando Echevarria

Cursou Humanidades em Portugal e Filosofia e Teologia em Espanha. Exilado em Paris, em 1961, dedicou-se à atividade docente e dividiu a sua existência entre França, Argélia e Portugal. Colaborou em publicações como Graal,Cadernos do Meio-DiaEros ou Colóquio/Letras. Surgindo num momento de balanço das tendências poéticas que atravessaram a década de 50, e anunciando já caminhos a percorrer na década seguinte, a novidade contida nas primeiras obras de Fernando Echevarría reside na escolha do poema curto assente “em insólitos enjambements, no amplo recurso à frase nominal, e na estranheza das imagens com que procurava expressar-se, em rude e humaníssima linguagem, o diálogo com o divino”, o excesso da expressão procedendo, não da proliferação discursiva, mas da “intensidade com que, dentro da tradição mística e da tradição barroca a que esteve exposto, por prolongada estadia num período decisivo da sua formação” (cf. MARTINHO, F. J. B., op. cit., p. 187, sobre uma nota de apresentação de Fernando Echevarría de Egito Gonçalves, datada de 1961). As metáforas verbais, o amplo uso da frase nominal, a disciplina rítmica e rimática, o jogo dialético das palavras reiteradas no poema, são algumas das características de uma poética que tem sido frequentemente inserida num movimento neobarroco na sua dupla fonte: a do contacto direto com a tradição gongórica e a releitura depurada dessa tradição efetuada pela geração espanhola de 27 (cf. GUIMARÃES, Fernando – “Fernando Echevarría”, in Dicionário de Literatura Portuguesa, Lisboa, 1996). Não será porém errado aproximar Fernando Echevarría de outras duas tendências contemporâneas: por um lado, a do desenvolvimento de uma poesia reflexiva, a que subjaz a especulação filosófica, e que aproxima o autor de alguns colaboradores de Eros, como Fernando Guimarães ou António José Maldonado, tendência, aliás, agudizada nos últimos títulos (Introdução à Filosofia e Fenomenologia); e, por outro lado, coincidente muitas vezes com a tendência anterior, a da compreensão, na esteira do simbolismo mallarmiano, da poesia como um instrumento de conhecimento, na decifração de uma dimensão absoluta e de uma verdade metafísica que podem ser entrevistas pelo uso do símbolo na condensação intensiva de todas as irradiações significativas de certas palavras.