As imagens da infância que marcaram o seu percurso, o gosto pela escrita de peças de teatro e as imagens do dia-a-dia que se transformam em poesia foram alguns dos assuntos abordados pelo escritor.

Quando era criança, na Nazaré, Jaime Rocha assistiu, todos os dias, à chegada dos barcos à praia e às mulheres dos pescadores, vestidas de negro e arrastando os seus filhos pelo areal, gritando e chorando a premonição da morte dos maridos. As ondas da Nazaré são conhecidas pelo perigo que representam para os pescadores e as peixeiras, antevendo um naufrágio, sofriam por antecipação. Quando os seus maridos chegavam sãos e salvos à praia reclamavam com elas pelo escândalo e pela gritaria. Para Jaime Rocha, isto era trágico e cómico ao mesmo tempo. Trágico pelo sofrimento das mulheres e cómico pela descompostura dos seus maridos. Desde cedo que o escritor conviveu com a tragédia e a comédia e, para ele, brincar e ilustrar com o que é mais negro equilibra a sociedade e a vida das pessoas. “Era um momento teatral e a praia era o palco. Nunca consultei um psicanalista para saber se comecei a escrever peças de teatro trágico-cómicas devido a estes episódios, mas suponho que sim. Cresci com estas fortes imagens na cabeça que devem ter criado um desejo de expressão através da escrita”. Jaime Rocha explicou que, “no Carnaval, os nazarenos transvertiam-se e faziam pequenas representações sobre estes episódios na praia. As mulheres não podiam assistir a estas peças de teatro, uma vez que também eram elas a inspiração para as personagens. Os homens vestidos de peixeiras representavam a morte e brincavam com ela. Ou seja, da tragédia passamos para a catarse e, depois, para o riso”.

Segundo Jaime Rocha, “todos temos a capacidade de juntar palavras. Nem todos possuem a capacidade de fazer literatura. Coisas simples do dia-a-dia, como uma casa, uma árvore, um pássaro são transformadas em literatura. Há uma magia que não sei descodificar. As palavras aparecem na nossa cabeça e, a determinado momento, juntamo-las e nasce um poema”. No entanto, Jaime Rocha considera que não é um dom, mas também não é algo que se pode aprender: “existem génios, sim, mas no meu caso são precisas muitas horas de trabalho”.

Jaime Rocha não escreve livros grandes: “como muito e faço dieta. Escrevo muito e depois corto, é a mesma coisa. Defendo que o que interessa para a escrita é o osso. Corto a carne, corto a gordura, enfim, o ruído, e fica só o osso”.

Para os alunos que gostam de escrever, Jaime Rocha deixou um conselho: “não há nenhum grande escritor que não seja um grande leitor. O escritor é um produto do que lê. Dizemos o que já foi dito por outros, mas de forma diferente. Não há temas novos. Há novas formas de ver os temas”.

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