O Cine-Teatro Garrett, como é habitual desde a primeira edição na Mesa de sexta-feira à noite, estava completamente lotado. A conversa decorreu durante duas horas, primeiro com as exposições de cada um dos convidados e depois com as intervenções do público.

Daniel Munduruku, escritor indígena, cresceu vivenciando o preconceito que os indígenas sofrem na sociedade brasileira. Expressões pejorativas como são mesmo índios incomodam o escritor. “Todos os estereótipos são repetidos à exaustão. A escola está parada no tempo, muito embora sua função seja trazer novos elementos para que os jovens, sempre ávidos por renovação, possam pensar meios de fugir aos pré-conceitos que carregam consigo. O caminho ainda é longo, enquanto os indígenas continuam sendo pouco compreendidos e aceitos”. Para o escritor, o grande mérito da literatura indígena está no fato de trazer novas leituras da sociedade brasileira. Ao dizer que os povos indígenas são defensores naturais da natureza, ela se contrapõe à ideia de desenvolvimento trazido puramente pela lógica do agronegócio, por exemplo, ou pela construção de grandes empreendimentos como hidrelétricas. A literatura indígena questiona conceitos como esses, dados ou impostos”.

Diferente da maioria dos índios, que ainda lutam para derrubar conceitos antiquados em relação às suas culturas e tentam conseguir espaço para mostrar as tradições, Daniel Munduruku vive da literatura indígena e conseguiu um feito inédito: os seus livros são adotados em diversas escolas públicas e particulares de todo o país. Um passo gigante em direção ao futuro: as crianças já começam a conhecer o índio verdadeiro, ao invés daquele ser nu, limitado e inferior que, durante cinco séculos, povoou a imaginação da sociedade brasileira”.

Isabel Lucas referiu Chimamanda Ngozi Adichie e o tema da igualdade de géneros com quinze sugestões de como criar filhos dentro de uma perspetiva feminista. Escrito no formato de uma carta da autora a uma amiga que acaba de se tornar mãe de uma menina, Para educar crianças feministas traz conselhos simples e precisos de como oferecer uma formação igualitária a todas as crianças, o que se inicia pela justa distribuição de tarefas entre pais e mães. E é por isso que este breve manifesto pode ser lido igualmente por homens e mulheres, pais de meninas e meninos. Partindo de sua experiência pessoal para mostrar o longo caminho que ainda temos a percorrer, Adichie oferece uma leitura essencial para quem deseja preparar seus filhos para o mundo contemporâneo e contribuir para uma sociedade mais justa.

Mário Zambujal disse que, até hoje, a palavra censura “desperta-me cá dentro todos os bichinhos”. Durante mais de 40 anos, nada seria publicado em Portugal sem que passasse primeiro pela censura. O conhecido “lápiz azul”, tantas vezes usado noutras cores, abateu-se sobre milhares de livros, sobre a imprensa e sobre qualquer manifestação cultural.

Da escola jornalística, que começou no jornal “A Bola”, ficou-lhe a “necessidade de contar coisas sem estacar na descrição marginal, de não sair do tempo”. Os seus livros são curtos porque custa-lhe encher. Mário Zambujal é de uma época em que “as pessoas perguntavam coisas umas às outras” mas vive num tempo em que “a gente pergunta tudo à Internet”. A grande pressão hoje sobre os jornais chama-se mercado. Contudo, sinto e sei que há recados, tentativas, consultores que tentam enfiar notícias. Custa-me mais quando é a própria justiça a fazer isso ou os seus agentes a manipular a informação.

Rodrigo Guedes de Carvalho afirmou que “a minha estética literária é para provocar uma visão cinematográfica. Não classifico como literatura um trabalho que não aposte na estética. Mas também não aposto no estilo esvaziado de sentido”. Cada vez menos gosta de rótulos e gavetas: “os homossexuais comportam-se assim, os empregados de restaurante comportam-se assado e os médicos comportam-se…” As pessoas são todas diferentes, tento dar-lhes muitas esquinas imprevisíveis em relação ao estereótipo que têm sobre elas. 

Para Rui Zink, “quem luta contra o politicamente correto está a lutar contra fantasmas porque, que eu saiba, não há sequer um ideário do politicamente correto”. Além do mais, prossegue o escritor e professor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, “este ódio ao politicamente correto implica que tenha havido uma idade de ouro onde todos tivéssemos sido muito felizes antes”.

Acompanhe o 19º Correntes d’Escritas no portal municipal e no facebook Correntes, onde pode consultar o programa completo do evento e ficar a par de todas as novidades.