Dedicando o seu texto ao povo madeirense, Manuel Rui considera que “as palavras também sofrem como as colinas que se fazem explodir, para se diminuírem pedra a pedra”, transformando-se numa “estátua de palavras mudas”. “Também ficam operárias como as mãos, pedra a pedra, na arte anónima das calçadas, para pisar, palavra a palavra”, dizendo, no entanto, que “nunca terei arte para lapidar uma pedra preciosa. Mas sei tocar, pedra a pedra, as pedras que tenho nas mãos e nos sonhos”.

Para Maria Teresa Horta não é só pedra a pedra que se constrói a poesia. É também corpo a corpo “sedução e pose, discurso do desejo a seduzir as palavras”, rigor a rigor, musa a musa, avidez a avidez, insubordinação a insubordinação, “cuidando de desmanchar as regras dos poemas, as imposições, as disciplinas”. Defendendo que “a escrita nunca esquece, nunca redime nem sublima”, Maria Teresa Horta terminou a sua intervenção dizendo que “aí, onde tu estás, é o começo da escrita”.

Seguiu-se Pedro Teixeira Neves, que também dedicou o seu texto à Madeira, ou não fosse a sua família de lá e ele tivesse nascido no continente “por acaso”. O escritor e jornalista tratou de apontar as várias semelhanças e diferenças entre pedra e poesia. “O poeta monumenta as emoções, por isso há poemas e livros que se confundem com catedrais”. Considera ainda que o poeta é um pedreiro “cujas pedras traz no peito” mas, como referiu, não convém que “transforme o poema num muro de lamentações”. Tal como as pedras, os poemas também corrompem e magoam. “Com pedras constroem-se casas, com poemas constroem-se abrigos”, acrescentou, considerando ainda, nesta relação de aproximação entre pedra e poema que, “com uma pedra pouco podemos, com uma palavra podemos muito mais”.

Mas nem tudo são semelhanças. De facto, e ao contrário dos poemas, as pedras não amadurecem, não surgem do nada, não fingem.  Os poetas são impacientes, a poesia tem identidade. E existem pedras raras “mas os grandes poetas muito mais raros são”. Não podemos viver sem poesia, mas há quem pareça “conseguir viver sem poesia”. E se uma pedra é apenas uma pedra, “a poesia é sempre mais do que aquilo que parece ser”.

Rosa Alice Branco apoiou-se numa “extraordinária”dissertação de Vítor Hugo sobre a arquitectura como o grande livro da Humanidade. “Ao falar da arquitectura como arte soberana, Vítor Hugo declara que toda a História dos Homens, durante muito tempo, se pode ler nesta arte feita de pedra”. Assim, e à semelhança da escrita, também a arquitectura “se iniciou com letras, ou seja, o Homem começou a aprender a usar o alfabeto de pedra”. “Eu quando escrevo poemas é porque amo as palavras”, justificou, “o modo inusitado como tudo muda quando as palavras se juntam em versos e quando de verso em verso, pedra a pedra, todas se conjugam num poema”. E um poema só é poema, ou seja, as pedras estão no lugar quando, como explicou, “nada foge ao ritmo do corpo, debruçado à janela das palavras”.

Estreante no Correntes d’Escritas, tal como Rosa Alice Branco, Tiago Gomes confessou que pouco tempo teve para “alinhavar umas pedrinhas”. Sobre o tema, considerou que, no seu caso, “pedra a pedra também se desconstrói e destrói a poesia. Disse-me a Lídia Jorge há 20 anos atrás que a poesia devia ser burilada, trabalhada, esculpida”. E por isso leu um texto, “O Uso das Palavras”, de Nathalie Sarraute, de forma a ilustrar o efeito que as palavras têm quando aparecem.

Um pouco afastado da literatura, tem trabalhado “nas palavras ditas. Faço letras para bandas rock. Estou a tentar educar os músicos, que às vezes são um pouco bárbaros mas que também gostam de poesia”.