A rabanada é um doce de referência na comunidade piscatória poveira. Elaborada com base em ingredientes acessíveis, enquadrava-se bem numa população cujas raízes não se sustentavam na abundância e que incorporavam na gastronomia a singeleza da sua vida quotidiana. A diferença estava na criatividade de quem confecionava, por isso a Rabanada está longe de ser um produto homogéneo. De casa para casa, ou mesmo em cada família, encontravam-se várias soluções, segundo as posses ou os gostos, e reforçando-se assim os sabores com diferentes opções (vinho branco, vinho tinto, vinho do porto, leite, água, etc.). No entanto, o que associa a Póvoa à Rabanada não é propriamente esta tradição familiar.

A conhecida “Rabanada Poveira” é um produto mais recente, com forte feição comercial e fruto de uma adaptação das tradições locais. Mais uma vez o responsável foi Leonardo da Mata (link).

No início da década de 50, o autor teve a ideia de apresentar a “Rabanada” na ementa do seu restaurante, procurando assim encontrar uma solução para as sobras de pão, o chamado bijou ou molete, mas designado pelos poveiros de “trigo”. Recorde-se que tradicionalmente as rabanadas eram feitas de pão cacete.

Definido o propósito, Leonardo da Mata pôs mãos à obra no sentido de conseguir um resultado convincente. Um percurso feito de tentativas até obter o resultado pretendido. A questão fundamental sempre foi a qualidade do pão facto que, com o passar dos tempos e a moda do “pão quente”, veio dificultar a tarefa.

Mantendo a tradição da comunidade piscatória, o autor recorreu a ingredientes básicos e o resultado final refletiu a mestria do cozinheiro.

José da Mata (filho e colaborador) conta que havia entre os compradores de rabanadas no restaurante clientes que sabiam distinguir quando os doces eram feitos pelo Sr. Leonardo ou pelos funcionários.

O sucesso das “Rabanadas Poveiras” ou das “Rabanadas do Leonardo” levava a grande procura deste produto quer na Póvoa quer na região, sendo frequente o envio para o Brasil. Era “obrigatório” para quem nos visitava levar para casa uns exemplares do doce de referência da Póvoa. Contou José da Mata que em certas situações (exemplo de jogos de futebol com equipas que traziam muitos adeptos) era necessário haver polícia para disciplinar a fila que se formava para comprar as rabanadas.

Este doce sobreviveu à morte do seu criador e é hoje possível encontrá-lo na ementa de muitos restaurantes da cidade, mas, como acontece nestas coisas da gastronomia, cada um tem um toque pessoal que o individualiza.

Receita

Ingredientes

Pão “trigo” (molete ou bijou) – de preferência seco e de boa qualidade, com massa bem fermentada; Leite em quantidade suficiente para que os pães fiquem “a nadar”; Ovos, em média 1 ovo por pão; Açúcar; Canela em pó e pau de canela; Sal (1 pitada)

Confeção

Aparar o pão nas pontas e parti-lo ao meio de forma a ter uma grossura homogénea. Colocar o leite a aquecer ao qual se acrescenta 1 pitada de sal, um pau de canela, canela em pó e açúcar a gosto. Demolhar os pães nesse leite morno para que fiquem bem cobertos e bem empapados. Espremer bem os pães e colocá-los numa travessa a repousar. Em seguida demolhá-los no ovo deixando absorver bem e fritar em óleo quente e abundante para que as rabanadas fiquem “a nadar”. Retirar e polvilhar com açúcar misturado com canela.

Receitas transmitidas pelo Sr. José da Mata, filho do Sr. Leonardo (2004)