A curiosidade foi crescente para perceber como retratariam os escritores o tema lançado pela organização do Correntes d’Escritas. O escritor argentino, Eduardo Sacheri, revelou ao público que “ o idioma é para mim um entrave e fui por isso buscar a definição de especular ao dicionário espanhol. O que me deteve foi o fato da palavra provir de espelho.”Afirma então que a partir do momento é que há um espelho a imagem refletida passa a ser uma miragem. Assume, portanto, acreditar que “a literatura é uma especulação, pois é o relato do mundo que, como os espelhos, implica uma distorção da realidade. Um salto para um mundo paralelo que desejamos e tememos”.

Inês Pedrosa afirmou que, «a expressão “toda a literatura” lhe dava arrepios pois a literatura nasce na singularidade de uma voz». Acrescenta ainda a ideia de que “especulação, hoje em dia, é a mãe de todas as guerras e a pureza a justificação última de todos os crimes”. Citando Rosa Monteiro, “não se pode ser puro sendo humano”. Continuou dizendo que “a especulação e a pureza são o contrário da literatura, porque o mundo se ajoelha no altar dos especuladores puros, que são os senhores do dinheiro, e chegamos a este cúmulo de crises. A literatura é especulação, se entendermos a palavra na sua epistemologia”.

João Bouza da Costa assumiu que também foi ao dicionário procurar o significado de especulação ao deparar-se com a dificuldade que teve em aceitar o tema que lhe foi proposto. Isto “pelo fatal campo de ressonância semântico do substantivo especulação, pois não existem palavras inocentes. Nos dias que correm o ato de especular remete com demasiada ligeireza para o epifenómeno financeiro, eufemisticamente denominado desregularização, onde uma elite de iluminados estoirou com a economia mundial contra um muro de realidade. Contudo especular não é só um negócio em que uma das partes abusa da boa fé da outra. Significa também raciocinar e meditar”. Concluiu que, só depois de se ter libertado das associações depreciativas da palavra pôde começar a especular sobre o tema.

Manuel Jorge Marmelo escolheu falar do tema através das histórias da sua vizinha, atualmente desaparecida. Foi ao especular sobre inúmeras possibilidades para o seu desaparecimento que arrancou gargalhadas gerais de um público atento. No final, não descobrimos qual das especulações poderia corresponder a uma remota realidade do que acontecera à sua vizinha mas o autor permitiu-nos, através da originalidade das suas especulações, pôr em prática, este verbo.

Pedro Rosa Mendes transportou cada um de nós para Timor-Leste onde ai decorria a maior das especulações. Conduziu-nos pelo enredo de um dos seus livros, no qual, a personagem principal, se debate entre a especulação da sua identidade criada e a identidade que tinha efetivamente. Toda esta ação teve lugar  «num terreno nobre, o da literatura”.

Rosa Montero, partilhou com o público que «a nossa memória é um conto que contamos a nós mesmos. É um romance, um livro que está em constante construção e onde a personagem principal somos nós, e onde, também, a sociedade reinventa uma memória coletiva”. Conduz-nos, pelo enredo de um conto, para realçar a importância do escritor se afastar dele mesmo e do que o rodeia para poder observar-se referindo que «só saindo de nós mesmos é que nos podemos ver e ver o mundo”. Avisa contudo, sabiamente, que esta proeza não é, de todo, fácil de alcançar”.

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