"O Grito" de Edvard Munch centrou a conversa na segunda Mesa de Debate do Correntes d'Escritas, esta manhã, no Cine-Teatro Garrett.
Moderada por Margarida Pinto Correia, a sessão contou com a participação dos escritores Afonso Cruz, Amélia Muge, João Tordo, José Alberto Postiga, Maria Francisca Gama e Marta Pérez-Carbonell, a quem coube a tarefa de dar o pontapé de saída no debate. A romancista espanhola abordou as semelhanças entre “O Grito” de Munch, que “representa a angústia vital e inerente ao ser humano”, e a Literatura, “uma ideia mágica e prodigiosa” que esbate a “fronteira entre o lemos e o que vivemos”. Para Marta Pérez-Carbonell, a personagem principal desta obra de arte “podia ser qualquer um de nós”, porque “quando um livro nos marca profundamente, cria uma realidade que nos acompanha para toda a vida”.
José Alberto Postiga concordou que esta “imagem povoa os olhos com angústia” e dá cor a uma ideia que teima em “ecoar nos nossos ouvidos”. A obra de Munch pode parecer, “à vista desarmada, de interpretação fácil”, mas, para o escritor poveiro, “encerra algumas particularidades” e remete para “traumas do passado” e para um regresso ao cemitério, “um lugar vaidoso e infestado de saudade que não se pode matar”.
Refletindo sobre as palavras de um pintor que provocou “uma rotura de paradigma”, Afonso Cruz abordou “uma verdade não visível sensorialmente, mas que sabemos existir”, que dá um sentido “mais profundo à arte e à vida humana, que precisamos de representar”. O escritor, realizador, ilustrador, designer e músico português entende que “a distorção amplia a realidade”, torna o invisível evidente, através do sentimento, porque “sempre que olhamos com emoção para um objeto, ele altera-se”. “A realidade está mal desenhada e pintada fora do risco, só não é aparente”, concluiu.
O tema em debate inspirou Maria Francisca Gama a refletir sobre a “injustiça da morte”, que nos “abalroa como se fossemos folha de papel num dia ventoso”, da qual “não estamos à espera, nem podíamos estar” e que nos deixa “surpresos e certos de que não a podíamos ter previsto”. Esta ideia de que “a morte, não-binária, andrógena, não pode ser verdade” leva à procura de “uma realidade diferente” e, ultimamente, segundo a romancista, remete-nos para o amor, para a Literatura e para a arte.
“Os artistas são adolescentes sem rede de amparo emocional”. A teoria de João Tordo, de que estes vivem “presos numa fase da vida em que tudo parece insuportável e de profunda angústia” entra em concordância com “este grito”, que, para o autor, é uma tentativa de “abertura de espírito às sombrias realidades que tanto nos afligem” e de “resposta para a aflição sistémica”.
A finalizar a discussão na Mesa 2, Amélia Muge falou num grito “instintivo e natural”, que está presente há 132 anos na arte de Edvard Munch e “há milhares de anos na humanidade”. Para a cantora e compositora, “só a pintura permite que um grito esteja sempre presente, gritando poderosamente no silêncio”.
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