São 20 anos após a criação da Rede
Nacional de Bibliotecas Públicas (1987) que não poderiam ser recordados sem que
viesse à memória de todos os presentes Manuel Lopes que, como referiu Maria José
Moura, “contra todas as evidências, está connosco aqui hoje” e este encontro é
“a materialização de um sonho desse meu amigo”.

Na sessão de abertura, Luís Diamantino,
vereador do Pelouro da Cultura, não pode deixar de referir, com notória
satisfação, que comparativamente aos resultados apresentados em estudos a nível
nacional sobre a leitura, a Póvoa de Varzim tem números seguramente mais favoráveis,
“Basta frequentar a biblioteca; basta passar pela sua extensão no Diana-Bar;
basta visitar as filhas mais distantes (pólos de leitura); basta lembrar as
bibliotecas de praia, porque até no areal os livros são boa companhia; basta
olhar para a Feira do Livro; basta lembrar o Correntes d’Escritas. Basta
lembrar isto, tudo isto. Porque é de todas estas iniciativas, que se articulam
e distribuem ao longo de todo o ano, que se constrói, entre nós, o milagre da
multiplicação dos leitores”. Para além disso, Luís Diamantino afirmou que a
política de incentivo à leitura do município passa também pelo apoio aos
autores locais, quer através edição das suas obras quer coeditando ou
adquirindo um número significativo de exemplares. “Só este ano participámos em
15 iniciativas editoriais (…). A colecção “Biblioteca Poveira – Na Linha do
Horizonte”, que já regista 17 títulos, é também motivo de orgulho para o
município” acrescentou o vereador. Luís Diamantino concluiu recorrendo às
palavras do grande intelectual brasileiro Prof Edson Nery da Fonseca, “uma biblioteca
deverá ser sempre uma viva assembleia de leitores”.

À assembleia de bibliotecários e amantes dos livros
e da leitura reunidos esta manhã na Biblioteca Municipal da Póvoa de Varzim, a
directora da Direcção Geral do Livro e das Bibliotecas, Paula Morão, deixou uma
palavra de apreço e reconhecimento pelo trabalho que têm desenvolvido em prol
das bibliotecas públicas, dando especial relevo à biblioteca da Póvoa, “uma
estrutura exemplar tanto pela qualidade como pela quantidade de actividades que
dinamiza”.

Biblioteca 20 anos 01 Biblioteca 20 anos 02


Num painel dedicado aos 20 anos de mudança
e inovação nas bibliotecas públicas, Henrique Barreto Nunes referiu-se à
biblioteca como sendo “o único lugar do mundo onde todos os cidadãos
independentemente do sua raça, religião, idade, sexo ou grau académico, podem
ler livros, revistas, jornais, ver filmes, aceder à Internet, consultar o seu email, assistir a espectáculos
culturais, dispor de formação,…”. A biblioteca municipal cada vez mais é um
serviço público gratuito, de base e de massas, acolhendo os marginalizados e
culturalmente excluídos de outros espaços públicos. Apesar de reconhecer que é
urgente criar normas e estabelecerem-se linhas de orientação que definam os
direitos e as responsabilidades do município para o efectivo e necessário desenvolvimento
das bibliotecas e dos serviços que prestam à comunidade, o bibliotecário
confessou que acredita na biblioteca como uma forma de intervir, de constante
provocação, um local permanente de sedução e conquista. Enfim, um amor para
toda a vida”.

A manhã terminou com a projecção de um vídeo in Memorium a Manuel Lopes, figura única
com uma acção cultural decisiva na Póvoa de Varzim e de reconhecida importância
no mundo dos livros e das bibliotecas.

Desafios para o futuro das bibliotecas públicas

Foi em torno do vocábulo “desafios” que
decorreu o debate durante a tarde de hoje, na Biblioteca Municipal. O dia foi
dedicado à reflexão sobre duas décadas de existência da Rede Nacional de
Bibliotecas Públicas, uma iniciativa organizada pela Biblioteca Municipal Rocha
Peixoto no âmbito das Comemorações dos 15 anos de existência do actual edifício
da biblioteca.

Foram apresentados alguns olhares sobre os
desafios da leitura pública que perspectivam um combate à info-exclusão e uma
acção preponderante das bibliotecas públicas na luta contra a marginalização numa
sociedade do conhecimento e da informação. A este propósito,
Isabel Sousa lançou a questão “Se ler é poder, para quem e até quando?”.

Biblioteca 20 anos 03

Sobre as perspectivas e desafios para o
futuro das bibliotecas públicas portuguesas, José António Calixto referiu seis
pontos essenciais: os recursos da informação; as tecnologias de informação e
comunicação (TIC); os recursos humanos; a investigação e produção teórica; o
financiamento, gestão e legislação e, por último, a cooperação. A nível de
recursos de informação, o desafio apresentado foi a duplicação de livros
disponíveis nas bibliotecas públicas portuguesas visto que, em 1997, Portugal
(0,9 livros por mil habitantes) se encontrava muito abaixo da média da União
Europeia (2 livros por mil habitantes). Também no que se refere a recursos
humanos, o nosso país apresenta médias abaixo de metade dos restantes países
europeus e torna-se urgente investir em novos perfis profissionais e na
formação permanente de quem trabalha na área da biblioteconomia. Quanto à
investigação e produção teórica, José António Calixto alertou para a assunção
pelos organismos do Estado e também pelas autarquias locais, da
responsabilidade e financiamento de estudos que contribuam positivamente para
avaliar o trabalho desenvolvido pelas bibliotecas públicas e possibilitar o
investimento em áreas mais carentes de reflexão e acção. Associado a este
aspecto, o bibliotecário afirmou que Portugal se encontra entre os países
europeus que menos investem nas bibliotecas públicas (menos dez mil euros por mil
habitantes) e é necessário dotá-las de maior autonomia em relação ao poder
local e central.

Uma ideia comummente partilhada pelos
investigadores da área e recomendada, aliás, no Manifesto da UNESCO é que a
biblioteca pública “deve ser objecto de uma legislação específica” e “garantir
um certo padrão de serviços”. Como referiu Manuela Barreto Nunes, “precisamos
urgentemente de uma Lei das Bibliotecas”.

Urgente também é cooperar e “cooperação
significa a partilha de trabalho, de competências e de dinheiro” e devemos
estar conscientes que “a cooperação exige um investimento, mas a não cooperação
resulta num desperdício de recursos”, lembrou José António Calixto. Teresa
Calçada partilhou esta necessidade de cooperação e afirmou que “hoje o desafio
é entendermos que existe uma biblioteca universal, com o mesmo catálogo, os
mesmos documentos, uma rede de conhecimento e informação que há duas décadas
surgiu entre nós” e “grande desafio é criar leitores que não possam prescindir
da informação e do conhecimento”, acrescentou.

José Afonso Furtado lançou um olhar sobre os
desafios da leitura pública, incidindo, essencialmente, na diversificação das
práticas de leitura que surgiram como consequência da multiplicação da oferta
em formato digital ocorrida nos últimos anos. “A relação com a leitura é, cada
vez mais, uma relação efémera e instrumental; lê-se apenas o que nos aparece à
frente”, afirmou José Afonso Furtado designando este fenómeno de “tendência da
aceleração da leitura”.