José Carlos Vasconcelos foi o moderador apresentando a vida e obra, sublinhando a faceta de historiador do convidado desta 13ª edição do Correntes d’ Escritas.

D. Manuel Clemente inicia o seu discurso sobre “Portugal e os Portugueses em 2008 e depois” conduzindo os seus ouvintes por um agradável conjunto de reflexões. Cinco pontos fulcrais foram abordados: “agradecer, começar, partir, consistir e coexistir”. O clérigo, em cada um dos pontos acima referidos, lembrou várias personalidades da escrita portuguesa, tais como o Padre António Vieira, Frei Luís de Sousa, Eduardo Lourenço, entre outros.

O ponto “agradecer” foi preenchido com palavras dirigidas à equipa de organização do Correntes d’Escritas, ao Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim: “Com o vosso convite, só posso ganhar e ganhar muito. Escritor, que para o Dicionário da Academia é a pessoa que escreve obras literárias ou científicas. Isto não sou nem nunca fui bastantemente, ainda que tenha escrevinhado e poetado alguma vez”.

Sobre “Começar”, D. Manuel Clemente referiu: “Começou onde geralmente se começa, na família e em duas mulheres viageiras. Uma viajava por dentro e quase só por dentro; outra também por fora, sempre que podia ser, sendo muito menos do que quereria. A minha avó materna chamava-se Aurora. A minha mãe nasceu no Porto e foi cedo para o sul onde eu nasceria. Chegou aos noventa e cinco e chamava-se Sofia. Esta a minha corrente mais próxima, entre chegadas e partidas, princípios concretos e fins almejados”. Todos começámos na família e com ela alcançámos o valor das raízes e da pátria, foi o pensamento que o público levou consigo depois desta Conferência.

No ponto “partir”, evocou o Padre António Vieira, nos seus sermões de Roma, e através dele refletiu sobre os portugueses nas suas partidas e viagens pelo mundo, no seu existir no mundo. Refere que “será em Roma, num exílio de circunstância (1670-1675) que, o Padre António Vieira, nos deixará o retrato de nós mesmos, portugueses. O pretexto será Santo António, o assunto será António Vieira, mas em geral fala de nós todos.”

O quarto ponto focado pelo Bispo do Porto foi “Consistir”: “é ser-se realmente, mesmo dramaticamente.” D. Dinis é a figura do consistir, pois “escreveu um trecho coincidente com o que os portugueses pensam em geral sobre si mesmos.” Portugal, sublinhou D. Manuel Clemente, “recortado pela espada de um rei meio borgonhês, expandido por uma visão de um príncipe meio inglês, regenerado de 800 para 900, por vagas meio francesas, quando não francesas de todo, das militares e políticas aos literários ideológicos, Portugal foi e é ainda uma importação, nunca tendo terra nem recursos para ser de outro modo”. Contudo remata dizendo que Portugal é a assimilação de várias culturas sem nunca perder a sua própria, importando sem nunca deixar de dar o seu toque português às coisas. Explicou também que foi “educado naquela ideologia que o Professor Eduardo Lourenço tão bem retrata, de forma crítica, nos seus tantos livros: que nós éramos sempre os melhores em tudo. Tive muita dificuldade em desencantar-me disto. Demorei a perceber que não era bem assim”.

Finalmente, sobre “coexistir”, o último ponto do seu discurso vem reforçar a coexistência de Portugal e dos portugueses fora da sua pátria: “As coisas são diferentes agora e até onde o podem ser, no mesmo povo”.

Sobre o emprego jovem e a emigração, o Bispo do Porto conclui que “o ficar e o partir se equacionam agora de modo muitíssimo diferente do que ainda há poucos anos nos caracterizava no geral. Atualmente, sem com isso descuidar a indispensável inviabilidade interna para as nossas gerações, somos surpreendidos com novidades em termos de comunicação e informação que alteram profundamente as vidas, os trabalhos e as mentes. Ir e vir pode agora ser mais perto”. Desenrascanço, dentro e fora da pátria, é a mais nova palavra do campo lexical português sem ter tradução possível tamanha característica portuguesa juntando-se à nossa célebre saudade. Concluiu, que “é possível que entre estas duas originalidades tão prática uma (desenrascanço), tão poética, a outra (saudade), vá singrando a barca portuguesa nas partidas e regressos que hoje somos. É esta a corrente que me leva e que tão singelamente vos descrevo.”

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