Ivo Machado confidenciou que acordou às 6h00, “nervoso com este encontro e a pensar naquilo que vos queria dizer”. Para o poeta, “um livro só se torna num livro quando alguém o lê, quando o autor o partilha. Até esse momento, é apenas um objeto”. O escritor contou como o “romance” da escrita começou na sua vida: “quando tinha 15 anos, decidi escrever um poema dedicado à rapariga de quem gostava. Entreguei-lhe a carta e sabem o que ela me disse? Nada. Virou-me as costas e foi-se embora. Nunca mais a vi”. Mas esta situação não desmotivou Ivo Machado, que continuou a escrever porque é “teimoso e persistente”. Esta história, no entanto, não terminaria com aquele virar de costas. “Há cinco anos fui lançar um livro à minha ilha, a Terceira. No final, uma senhora aproximou-se, entregou-me um envelope e sabem o que me disse? Nada. Virou-me as costas e foi-se embora. Sabem o que continha o envelope? O poema que eu tinha feito há mais de trinta anos atrás”.

Em Beiriz, Ivo Machado voltou a manifestar a sua admiração por Sophia de Mello Breyner: “Quando tinha a vossa idade, pareceu-me vê-la na minha ilha, a Terceira. Na altura, não tinha televisão e a única imagem que eu tinha visto dela tinha sido num livro. Disse entusiasmado a um amigo ‘aquela senhora é a Sophia de Mello Breyner!’ e pus-me a segui-la pela ilha. Durante uma hora e meia andei atrás dela, até que ela me parou e eu finalmente lhe perguntei se era a Sophia. ‘Sou’, respondeu-me. Convidou-me para lanchar e eu estive meia hora a dizer-lhe poemas seus que sabia de cor”. O poeta açoriano explicou aos alunos que a escritora se encontrava na ilha em campanha eleitoral com Mário Soares e que, há alguns anos, quis descobrir em que dia se tinha dado aquele encontro. Procurou em jornais locais e em nenhuma das notícias acerca da visita de Mário Soares à Terceira mencionava que Sophia de Mello Breyner fazia parte da sua comitiva. “Anos depois tive várias oportunidades para reencontrá-la, mas não quis. Preferi preservar aquela memória, tão especial, em que ela me disse ‘a única pessoa que me conheceu foste tu’.

Sobre o poder da literatura, Ivo Machado contou que “a primeira vez que fui a Paris tinha 14 anos. Estava numa cama de hospital e ofereceram-me o livro Paris é uma festa, de Ernest Hemingway. Através desta obra viajei até à capital francesa e, quinze anos mais tarde, quando realmente visitei Paris pela primeira vez, estive à procura dos sítios que Hemingway descreve no livro. Essa é a importância de um livro”.

Coincidentemente, João Tordo também mostrou pela primeira vez um poema escrito por si a uma rapariga de quem gostava. A reação foi bastante semelhante à obtida por Ivo Machado. No entanto, o desfecho foi um pouco diferente: “Ela odiou, mas ainda bem. Há uns anos atrás encontrei-a num supermercado e ela era muito feia”, brincou. “Nunca mais escrevi poesia na minha vida, nem me atrevo a alinhar um verso”. O autor revelou que o “fracasso faz parte da vida e as relações têm imenso potencial para falhar”.

João Tordo partilhou com os alunos que um gémeo idêntico faleceu algumas horas depois de ter nascido. Este facto da sua vida deu origem ao livro O Ano Sabático, o seu mais recente trabalho. Sobre O Bom Inverno, o escritor explicou como surgiu a sua obra mais vendida: “o valor monetário que recebi com o Prémio Saramago permitiu-me ficar em casa um ano. Deixei todos os meus compromissos profissionais e quis escrever. Passadas três semanas ainda não tinha escrito nada. Os dias eram passados no sofá, a ver televisão e a comer congelados. Como só me alimentava assim, comecei a pensar que ia ter um ataque cardíaco. Então, resolvi escrever sobre um escritor com um bloqueio criativo, que passava os dias no sofá, a ver televisão e a comer congelados e, por isso, pensava que ia ter um ataque cardíaco. E assim, sobre nada, escrevi o livro que mais vendi até hoje”.

O Correntes d’Escritas começou oficialmente esta manhã. Acompanhe todas as notícias e veja as melhores imagens aqui: