“A Coluna Partida” de Frida Kahlo foi o ponto de partida para a Mesa 5 do Correntes d’Escritas, esta manhã, no Cine-Teatro Garrett.
Moderada por José Mário Silva, a sessão contou com as comunicações de Adelino Albano Luís, Alexandre Vidal Porto, Carlos Quiroga, Helena Vasconcelos e Maria Isaac.
Adelino Albano Luís, estreante no evento e dos mais novos escritores participantes, vindo de Macossa, “um distrito repleto de histórias com gente maravilhosa”, partilhou com o público algumas histórias.
O escritor e filósofo moçambicano considera que o acidente que Frida sofreu é a génese da pintura e daí retirou a sua lição: “é preciso escrever sobre a minha realidade”, mas em duas perspetivas: como Adelino, aquilo que ninguém pode ver e enquanto cidadão do mundo”. Confessou que, como escritor, “encontro-me com diversos personagens. Sofro com suas dores e angústias. Encaro como minha a realidade deles porque estão na minha alma. A arte deve ser o espelho da minha alma”.
Terminou assumindo-se como um ativista do livro e deixou o apelo: “num mundo cada vez mais marcado pela tecnologia, temos de ser mais criativos para cativar as pessoas para o livro e para a leitura”.
Alexandre Vidal Porto começou por confessar que Frida Kahlo não é uma artista da sua maior predileção e achou “insólito” fazer a sua comunicação a partir da obra: “nunca tinha feito esse exercício, mas atraem-me coisas insólitas”.
Na sua interpretação, Frida quis ver aquilo que cada artista quer ver quando compõe: “dar um certo sentido à existência insuportável, um pedido de ajuda à vida e um aviso a quem viverá depois de nós. Cada artista compõe com as tintas que a vida lhe disponibiliza. Todo o mundo é artista da própria vida”.
Carlos Quiroga revelou que quando viu a proposta sentiu “um contraditório arrepio” e falou da sua experiência perante a dor desde a “vida de gladiador” que levou na adolescência porque acreditava que podia tudo, até uma recente rutura que o fez ter “pensamentos suicidas pelas dores que sentia. Tudo isto permite chegar ao calcanhar do que está representado no quadro”, concluiu.
Após recorrer a outras obras de arte e poemas para fazer analogias com o quadro “A Coluna Partida”, o escritor e linguista galego apresentou e leu ao público um poema da sua autoria que intitulou “femme blessé ao megatoscópio”.
Helena Vasconcelos focou a sua comunicação no quadro que já viu ao vivo e a partir daí apresentou um ensaio profundo sobre a tortura e a violência sobre as mulheres. Para a escritora, “o que Frida experimentou foi tortura continuada, pertinente cruel” e definiu o termo tortura como “o resultado de um acidente, dolorosa e debilitante. É uma ação que leva à submissão e à desumanização”.
Helena Vasconcelos considera que nas referências de dor e violência do quadro podemos detetar “a simbologia do martírio e um êxtase que nos faz recordar homens e mulheres sujeitos a torturas”. E sobre esta triste realidade da violência que ainda nos assola, advertiu: “nem tudo pode ser salvo ou mitigado pela arte. É absolutamente necessário que estejamos atentos e possamos alterar este dramático estado de coisas”.
Esta mesa começou e terminou com estreantes, cabendo a Maria Isaac a última comunicação desta manhã. A escritora partilhou com o público a coincidência de lançar no Correntes d’Escritas um livro cujo personagem tem uma história semelhante à retratada por Frida e sobre a qual refletiu. E a este propósito, considera que a dor é animal e sofrimento é humano, sendo que a dor é única no sentido que tem, porque quebra o espírito humano de lidar.
A escritora revelou um fascínio pela dor, que também funciona como um “alicerce de empatia. A arte funciona muito neste princípio de partilha e ajuda a criar memória coletiva. Todos os livros têm um sofrimento, dor, superação e aprendizagem”. Terminou, com o título de um livro de Rubem Alves, “Ostra Feliz não Faz Pérolas”.
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