Os municípios têm sido uma das instituições locais mais solicitadas a trabalhar no campo educativo quer como interventor autónomo quer como parceiro do estado ou de instituições particulares. Indicações desse fenómeno são tanto as referências legais como as solicitações locais à sua intervenção.

Daí que se fale hoje de um alargamento do âmbito de competências municipais de educação, como se pode verificar através do decreto-lei nº159/99 de 14 de Setembro e de estar em curso a instituição de um nível local de administração educativa.

São várias as razões para esta situação, nomeadamente a erosão do paradigma do Estado Educador, o desenvolvimento de relações horizontais de interdependência entre as instituições educativas e os parceiros locais e os movimentos para uma maior descentralização das competências educativas, num contexto europeu e não unicamente português, para as instituições locais.

Subjacente a estas tendências descentralizadoras, que surgem nos sistemas educativos europeus, com maior ou menor amplitude, está a perceção da complexidade da educação escolar numa época de escolarização de massas, com a sua heterogeneidade cultural e social, com a transferência para dentro da escola de problemas de integração social e de formação ocupacional, de educação cívica e moral, de diferenciações culturais, de desagregações familiares e de fenómenos de marginalidade.

Em contraposição a estas abordagens unilaterais, tem-se imposto cada vez mais uma visão integradora que conjugue os esforços de todos os parceiros societais do território no processo educativo anteriormente apenas assumido pela escola ou por outros parceiros isolados. É nesta perspetiva que é referido o município como uma das instituições relevantes do espaço local que não poderá mais estar ausente da ação educativa.

A esta explicação sociológica acrescem outras de natureza mais política que têm a ver com a consolidação da ideia moderna sobre democracia, ou seja uma democracia descentralizada.

O município é um dos pilares centrais de um regime democrático e pluralista, sendo a educação um dos campos de intervenção que neste regime lhe é naturalmente reconhecido.

Assumida a vontade política de uma inteira participação na construção da escola moderna, o Poder Local mostra-se já preparado e aberto para desempenhar um papel mais ativo na área da educação. Disponibilidade que radica, também, na certeza das indiscutíveis capacidades do municipalismo português nunca terem sido suficientemente potenciadas pela Administração Central.

Apesar das ainda vigentes limitações estruturantes, a educação vem revelando uma importância sempre crescente na atividade desenvolvida pela Administração Local, que tem multiplicado, ao longo dos anos, as realizações neste campo, quer em termos de edificações, quer no que diz respeito à prestação de serviços.

Os municípios viram alargado o seu quadro de competências com a delimitação das áreas de investimento e a introdução de novas obrigações em matéria de educação e ensino.

A educação passou notoriamente a ocupar uma posição relevante no quadro das atividades municipais, seja em matéria de edificação e gestão de equipamentos, seja na prestação de serviços no âmbito da ação social escolar, a que corresponde um crescendo de preocupações sobre os meios instrumentais e financeiros que viabilizem essa política setorial local.

O surgimento da educação como objetivo da política municipal deu-se de forma cadenciada, antes mesmo de serem formalmente delimitadas as competências das Administrações Central e Local em matéria de investimentos.

Realmente, há já muito que grande parte das Câmaras Municipais chamou a si a preocupação derivada da edificação de estabelecimentos de ensino básico, conhecimento que as autarquias têm da realidade local e da necessidade de corresponder a carências profundas que ainda se mantêm.

O salto positivo que se tem registado na atividade municipal, com a sua abertura a novos domínios, reflete-se também no aspeto educativo.

Os princípios normativos de filosofia global consagrados na Lei de Bases do Sistema Educativo permitem a configuração de alguns traços de possível atuação municipal, nomeadamente quanto à participação das autarquias na administração, e quanto à inserção da escola no meio, que passam, designadamente, pela colaboração município/freguesia, pela ocupação dos tempos livres e pela participação na gestão das escolas.

Os municípios portugueses, nos novos desafios que a modernidade comporta, e no desiderato de serviços que desde sempre caraterizou a sua atuação, estão empenhados e profundamente interessados na otimização de enormes potencialidades que a sua perfeita inserção no terreno propicia.

Com a ponderação exigível num setor tão sensível da nossa vida coletiva como é a escola, os municípios assumem a aceitação de transferência de novas competências em matéria de educação e de ensino, desde que devidamente contratualizadas, acompanhadas pelos dispositivos legais e regulamentares adequados, publicados em simultâneo com a atribuição dos meios necessários para fazer face às novas funções e encargos. Na convicção prévia, sempre reiterada, de que tais alterações se traduzem num melhor serviço às comunidades.

O desenvolvimento sustentado e harmonioso do nosso país exige do poder local uma consequente atuação também na área da educação. Com a energia permanentemente renovada que os vitaliza, os municípios afirmam que urge investir, descentralizadamente, sobretudo nas gerações mais novas, pois são elas quem irão continuar, amanhã, um Portugal grande.

Tratar de compreender e auscultar não sobre os aspetos ligados à parte pedagógica, que são da responsabilidade do Ministério da Educação, mas sim sobre as atividades e serviços de apoio que o Município pode prestar e alguns dos quais são da sua competência, considerando que a educação não se limita à atividade formal (trabalho académico) mas sim também informal, através de programas e ações que completam as atividades do ensino.

 

COMPETÊNCIAS DOS MUNICÍPIOS NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO

 

Desde 1984, no domínio da educação foram transferidas para os municípios várias competências através das leis de aprovação do Orçamento do Estado, sempre se dispondo que o respetivo exercício seria objeto de regulamentação própria a editar pelo Governo.

A transferência para os municípios das competências em matéria de organização, financiamento e controle de funcionamento dos transportes escolares foi operada pelo Decreto-Lei nº 299/84, de 5 de Setembro.

Em matéria de ação social escolar, as competências das Câmaras Municipais foram definidas pelo Decreto-Lei nº 399-A/84, de 28 de Dezembro.

Entre 1985 e 1987 não se verificaram transferências de novas competências para as autarquias, como se pode ver das leis que aprovaram o Orçamento de Estado para esses anos.

Em 1988, a Lei nº 2/88, de 26 de Janeiro, que aprova o Orçamento de Estado para 1988, transfere novas competências para as autarquias, nomeadamente ao nível do pessoal não docente dos estabelecimentos de educação pré-escolar, do ensino primário e do ciclo preparatório TV, “bem como a respetiva gestão”, havendo o exercício destas novas competências ser objeto de regulamentação, mais tarde.

A lei nº 101/89, de 29 de Dezembro, que aprova o Orçamento de Estado para 1990, refere no seu artigo 52º que “fica o Governo autorizado a prosseguir em 1990, no âmbito da colaboração do poder local na modernização das infraestruturas do ensino, as medidas previstas no artigo 55º da Lei nº 114/88, de 31 de Dezembro, já acima abordado.

Novas competências voltam a ser transferidas para as autarquias, com aprovação do Orçamento de Estado para 1995, através da Lei nº 39-B/94, de 27 de Dezembro, as quais dizem respeito às áreas: da cultura, da administração interna, das finanças, da indústria, da educação, dos transportes, do comércio e do turismo.

Em 1997, no âmbito da aprovação da Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar, a Lei nº 5/97, de 10 de Fevereiro, que consagra este nível de ensino como a primeira etapa da educação básica, definindo o papel participativo das famílias, bem como o papel estratégico do Estado, das autarquias e da iniciativa particular, cooperativa e social; é publicado o Decreto-Lei nº 147/97, de 11 de Junho, que procede ao desenvolvimento da Lei-Quadro. Este diploma define o apoio financeiro ao desenvolvimento da rede nacional de educação pré-escolar em termos de infraestruturas, equipamentos e apetrechamento, funcionamento e formação, podendo candidatar-se aos apoios financeiros os municípios, as instituições particulares de solidariedade social, os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo e todas as instituições sem fins lucrativos que prossigam atividades no domínio da educação e ensino.

Em 1999, com a publicação da Lei nº 159/99, de 14 de Setembro, foi estabelecida a Lei-Quadro de Transferências de atribuições e competências para as Autarquias Locais, bem como a delimitação da intervenção da administração central e da administração local, concretizando os princípios da descentralização administrativa e da autonomia do poder local previstos, no artigo 237º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

O presente diploma pretende elencar as atribuições das autarquias locais, a sua natureza, as competências dos órgãos municipais e as modalidades e o prazo de transferência dessas competências para os municípios, estabelecendo ainda mecanismos de aferição do processo de descentralização administrativa. Esta lei vem revogar o Decreto-Lei nº 77/84, de 8 de Março e demais legislação que contrarie o disposto na presente lei.

Neste mesmo ano, a 18 de Setembro é publicada a Lei das Autarquias Locais, lei nº 169/99, que estabelece o regime jurídico do funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias bem como as respetivas competências.

O presente diploma, ao contrário do que o antecedeu (o Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março) e que agora é revogado, não enumera as atribuições das autarquias locais.

Estes dois últimos diplomas aqui abordados, embora tivessem pretendido concretizar, sequencialmente, as competências ao nível da educação elencadas na Lei nº 159/99, de 14 de Setembro, o certo é que se tratou de uma intervenção meramente formal, que, em termos reais, nada acrescentou a estatuições anteriores constantes dos Decretos-Leis nº 77/84, de 8 de Março, 299/84, de 5 de Setembro, 399-A/84, de 28 de Dezembro, e 115-A/98, de 4 de Maio.

Daí que a publicação do Decreto-Lei nº 7/03, de 15 de Janeiro, venha colmatar as lacunas existentes, transferindo novas competências para os Municípios, desta feita no que diz respeito aos conselhos locais de educação, um órgão de essencial institucionalização da intervenção das comunidades educativas ao nível do concelho, e relativamente à elaboração da carta educativa, um instrumento fundamental de ordenamento da rede de ofertas de educação e de ensino.

Em termos complementares, o presente diploma regulamenta ainda competências na área da realização de investimentos por parte dos municípios, nos domínios da construção, apetrechamento e manutenção dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico, referindo, ainda, no seu artigo 28 º, que no respeitante à gestão do pessoal não docente dos estabelecimentos de educação do Pré-Escolar e do 1º CEB, o Governo, em articulação com a Associação Nacional de Municípios, tomaria as providências normativas e financeiras necessárias a essa gestão. O que efetivamente continua por regulamentar é a gestão do pessoal relativo ao 1º CEB. Em nosso entender seria vantajoso para os estabelecimentos de ensino que esta regulamentação se fizesse pois estando mais perto, a autarquia teria outra eficácia na substituição deste pessoal sempre que se justificasse.

Voltam a ser transferidas atribuições e competências para os municípios, na aprovação dos Orçamentos do Estado para o ano de 2001, através da Lei nº 30-C/2000, no âmbito da Lei nº 159/99, de 14 de Setembro, que será abordada mais à frente; e para o ano de 2002, através da Lei nº 109-B/01, de 27 de Dezembro.

Não temos dúvidas que é a pensar no interesse das populações que a transferência de competências para os Municípios, nomeadamente ao nível da educação, tem vindo a ser cada vez maior. É de mais evidente que uma intervenção ao nível local é de longe mais eficiente e eficaz, pois a autarquia tem uma visão mais pormenorizada do que é necessário para melhorar a qualidade de vida dos seus munícipes, nomeadamente no que diz respeito ao contributo para a melhoria da qualidade do ensino dos alunos que frequentam os estabelecimentos escolares do seu concelho.

Contudo, o que se tem verificado é que essa transferência de competências, no qual o setor da educação não é exceção, delimitada em normativos, deixa muitas vezes os Municípios em grandes dificuldades para as concretizar, sujeitando-as a um esforço financeiro orçamental acima do que lhes é permitido, isto porque de facto, simultaneamente, não se concretizam as transferências das verbas correspondentes.

Todavia, a Administração Central é conhecedora que os autarcas, uma vez eleitos democraticamente, tudo farão para melhorar a qualidade do ensino no seu município, mesmo que isso signifique custos acrescidos no seu orçamento anual, o que realmente se tem vindo a verificar.