Gaspar Hernández afirmou que “vivemos numa sociedade doente porque conceptualizamos a vida. Uma coisa é a rosa e outra é a palavra rosa”. Para o escritor essa doença dá-se pelo nome de ansiedade. “Temos medo do futuro. Medo de perder o trabalho, de não poder comer, de pagar as contas. E esse medo é criado pelo excesso de pensamento”, sublinhou. “Mas existe uma dualidade no pensamento: se, por um lado, é através dele que temos este belo teatro, o excesso do seu uso pode provocar a depressão”, acrescentou Gaspar Hernández.

Os historiadores procuram saber como viviam determinadas sociedades através de romances: “os livros permitem-nos entrar na mente das pessoas. Se vemos um filme, não sabemos o pensam as personagens. Apenas sabemos como elas são e o que vestem. Mas se lermos um romance sabemos o que pensam. E isso é o que interessa na literatura”.

Hernández falou sobre um estudo científico que comprova que “o cérebro não distingue entre o que é imaginado daquilo que é visto. São ativados os mesmos mecanismos quando vemos e imaginamos. Para o nosso cérebro, quando estamos a ler e, consequentemente, a imaginar todos os pormenores, estamos a viver a realidade”.

Paula de Sousa Lima começou por afirmar que sempre foi uma aluna muito dedicada e uma pessoa muito obediente graças à educação do pai, militar. Por isso, não “fugiu” ao tema proposto pela organização do Correntes d’Escritas: “Toda a palavra será sempre um jogo por inventar”.

A escritora afirmou que a “poesia é a procura daquilo que ainda é virgem, um jogo por inventar, uma eterna aventura criativa e que tem uma relação íntima com o poeta. E nem sempre pacífica”. Paula de Sousa Lima não acredita na inspiração. “A arte nasce da aliança entre o talento e o trabalho”. A escritora confessou que “às vezes, as palavras resguardam-se e eu tenho de esperar por elas para as domar e as fazer minhas”. Por outro lado, “as palavras não são como os números, infinitas. Como inovar? Como não cair na falácia de escrever o que já foi escrito?”

Rita Taborda Duarte iniciou a sua participação citando Herberto Hélder, que dizia algo como “a única regra na literatura é a batota”. Ao mesmo tempo que “há palavras que nos metem medo, um poeta nem sempre é meigo com elas, como se poderia pensar. A poesia é uma arte que se move entre rebeliões contra as palavras. Elas atacam o poeta e ludibriam-no”.

“Alguns escritores”, disse Rita Taborda Duarte, “inventam as regras do jogo só com o objetivo de as quebrar”.

“O poeta é um torturador de palavras. Força-as a dizerem aquilo que elas não querem dizer e os verbos são as palavras que têm pior feitio”, concluiu.

Selva Almada contou que passou alguns dias em casa da irmã para ajudar a tomar conta do filho desta, de nove anos. O rapaz passava o dia todo em frente ao computador e quase não se divertia fora de casa. Um dia pediu à tia que jogasse com ele. Selva Almada recusou porque não sabia jogar no computador. Mas a sua irmã alertou-a de que o jogo a que o rapaz se referia era o Scrabble, um jogo que consiste em formar palavras. “Passamos os três dias seguintes a formar palavras. Eram campeonatos ferozes e eu ficava emocionada como ele formava palavras mesmo com erros ortográficos, que eu corrigia depois”.

Selva Almada disse que vem de uma família muito pobre, sem dinheiro para comprar livros. Por isso, a escritora lia tudo o que havia para ler e fosse grátis. Não lhe interessava os jogos insípidos das outras meninas: “para que queria amigas se tinha os livros?”.

“Ler é como entrar numa piscina de água gelada num dia muito quente”.

Em criança, Selva não se imaginava escritora e que poderia dar felicidade a pessoas como ela, que vivia para ler.

Um professor disse a Selva Almada que um escritor precisa “escrever muito, ler muito e viver muito. As duas primeiras eu faço-as mas a última calculo que vá levar uma vida inteira”.

Sobre a sua forma de escrever, Selva afirmou que tem de ter “uma paciência infinita comigo própria e tenho com as palavras a relação com que a minha mãe me dizia para comer a sopa, às vezes com doçura, às vezes com ameaças”.

Tatiana Salem Levy anunciou estarmos “a viver o fim de um mundo e o início de outro. Estamos em plena transição e assustados com o desconhecido. É aí que a linguagem é importante, uma vez que é ela que cria o mundo”. A escritora brasileira sublinhou ser “importante escolhermos o que vamos levar deste mundo que está a acabar. Falamos do fim da democracia e espero que possamos levar a literatura para esse mundo novo porque ser escritor é ser livre”.

Para Tatiana, a literatura é sempre política. “Se não, o que é? Os lírios brancos e o mar sereno? A literatura não tem sempre de passar uma mensagem mas ela dá novos sentidos às palavras”.

“Enquanto houver literatura não só haverá este mundo como muitos outros”, concluiu.