Com moderação de Carlos Quiroga, a mesa ficou marcada pelo espanto e estranheza que tal tema colocou e que obrigou a alguma pesquisa por parte de todos os participantes, a saber Adolfo García Ortega, André Sant’Anna, Eugenia Almeida, José Norton e Mário Pinheiro.

Num primeiro momento esta ligação entre literatura e perversão parecia impossível para García Ortega, pois, na sua opinião, a literatura é algo de transparente e a perversão algo de obscuro. Uma segunda análise, já a nível etimológico, permitiu ao escritor espanhol chegar a uma outra conclusão: por definição no dicionário, perverso significa algo de mau e viciante e também diz respeito a algo que é alterado negativamente. Ora, se escrever é viciante e ler implica a alteração da conduta, então Escrever é um Gesto Perverso.

Também Eugenia Almeida investigou a palavra perverso. Primeiro através do dicionário, depois na literatura ligada à psicanálise (onde tudo é perverso e “e as palavras nunca significam o mesmo que para o resto dos mortais”, disse) e finalmente, junto de um amigo especialista em etimologia. Foi ele que lhe deu, como definição de perverso, “tomar algo e dar a volta”, algo que, de facto, acontece na literatura, “um mundo de possibilidades, onde posso corrigir, inventar palavras, voltar atrás.”

Tal conclusão teve a concordância de José Norton, cuja experiência literária passa, em grande medida, pela elaboração de biografias, trabalho que pede um grande esforço de investigação. E é neste trabalho que José Norton vê perversidade, ao dar a volta “a ideias feitas que tenho encontrado em biografias que eu, através da minha investigação, concluo que não foi bem assim. Passo a ideia real, dou a volta às coisas”.

Na mesa participou ainda André Sant’Anna, cuja obra está marcada pela temática da sexualidade, que alguns vêem como perverso. “Mais do que a literatura é a arte que perverte a cultura” disse, “e a cultura tenta impor um formato”.

A fechar a mesa, Mário Pinheiro confessou também a sua estranheza face ao tema, um bom sinal, referiu, pois “estranhar é começar a compreender as coisas”. Conclui, então que “não há perversidade no simples acto de escrever, poderá é haver subversão”, identificado a perversidade não na literatura em si própria mas na comercialização da mesma: “a perversidade consiste no encher dos bolsos à custa da ingenuidade dos outros”, afirmou.

Correntes d’Escritas continua amanhã com mais quatro mesas de debate.