Moderada por Raquel Marinho, a sessão contou com as comunicações de cinco poetas contemporâneas, Amalia Bautista, Ana Paula Tavares, Inês Francisco Jacob, Rosa Alice Branco e Yolanda Castaño.

Para a Rosa Alice Branco, “a pintura dá a ver a imagem não as coisas, porém a arte, tal como a pintura, a cinema e a literatura criam atmosferas, personagens, mundos, capazes de originar em nós as sensações e emoções que nos podem fazer chorar ou rir até às lágrimas e, sobretudo inspiram-nos, transformam-nos e fazem de nós mais”.

A autora referiu que no quadro de Dalí estão representados três tempos: passado, que se refere à infância do pintor; presente, a derreter-se e o futuro, efémero. A este propósito, transmitiu que o esquecimento é necessário, muitas vezes, compulsivamente à criação.

Para abordar o tema, Ana Paula Tavares escolheu falar da procura das vozes iniciais que deixaram na sua memória e na sua luta contra o esquecimento uma impressão digital forte de uma língua que até hoje não fala e da qual foi privada, mas que foi a que a moveu para a poesia, a língua dos pastores e, sobretudo das mulheres da região de Huíla (sul de Angola).

A historiadora e poetisa angolana confessou que escreve em português, a sua língua materna, mas é a outra, que não consegue decifrar, cujo som ficou como sua memória pessoal e é “ela que me conduz nos caminhos difíceis da poesia. Há uma persistência da oralidade dos pastores”.

Ana Paula Tavares considera que “a modernidade não se compadece com a forma de vida desses povos e há uma ameaça real do seu desaparecimento da terra. Isso torna-me, à medida que envelheço, cada vez mais fiel a essa oralidade do meu crescimento, da infância, da adolescência e do me momento em que me tornei mulher, ao mesmo tempo que tenho consciência dos fenómenos da atualidade”.

Yolanda Castaño agradeceu o privilégio de poder fazer a sua comunicação na sua língua materna, o galego, o que nem sempre acontece nos eventos em que participa.

Para a vencedora do Prémio Nacional de Poesia de Espanha 2023, a poeta trabalha sempre com a memória, que pode ser recente (de há dias, meses), mas é sempre memória, acrescentando que “não é recomendável escrever a quente, porque pode ser desbocado. É necessário distanciamento, só depois opera a memória. O poema é uma memória encapsulada”.

Na sua perspetiva, “a poesia transporta-nos, ela é capaz de transcender a memória porque pode falar em passado e futuro ao mesmo tempo. É uma arte temporal, que necessita de tempo de escrita para ser decodificada”.

Amalia Bautista optou por deter-se no título da obra transmitindo que “a memória é uma característica fundamental dos humanos e não se pode escrever nem ler poesia sem memória”, acrescentando que “com a mente em branco não somos capazes de ler e estabelecer conexões”, pois a capacidade de identificação só a memória nos dá.

A poetisa referiu-se ao facto de que quem perde a memória, das poucas coisas que recorda são canções e poemas da infância, acrescentando que temos que ter memória para nos conectarmos. Revelou que tem muitas recordações na sua poesia, que faz questão de registar para não esquecer.

Para Inês Francisco Jacob, “o que persiste não é a memória, mas sim o esquecimento” encarando a “memória como uma arma contra tudo e todos”.

A poeta partilhou que o convívio com pessoas mais velhas, nomeadamente as avós tem uma influência gigante na sua vida e na escrita: “a minha vida é constantemente facilitada. Mas tenho que servir-me da memória para a minha escrita porque tenho medo da finitude e da morte das minhas avós”

Para a autora que escreve desde a adolescência, “é inevitável não referir as avós”, apesar de considerar que “escrever, quando não é por obrigação, já é um exercício de memória e a escrita é dos melhores exercícios artísticos para percebemos aos poucos quem somos”.

Acompanhe a 26.ª edição do Correntes d’Escritas no Portal, no Facebook e no Instagram. Veja a Conferência de Abertura e as Mesas de Debate aqui ou no Youtube. Consulte o Programa completo.