Primeiro dia «oficial» das Correntes d’Escritas. Primeiro dia desta etapa das nossas vidas, como alguns bem sabem. A meio da tarde, Leonor Xavier falou sobre o seu novo livro, Passageiro Clandestino (Temas e Debates; 2015), em conversa (no mais justo sentido do termo) com Rui Zink. Contava-nos ela que quando se deparou com o problema do cancro e deu início ao tratamento, desencadeou também um processo de escrita. «Continua a escrever… continua…continua…», respondeu-lhe Guilhermina Gomes, a sua editora, quando lhe deu conta.

Já de manhã, na sessão de inauguração, Almeida Faria, figura em destaque na revista anual do festival, evocou Virgínia, velha e cândida criada de família. Quando autor de Rumor Branco adquiriu alguns livros em leilão, o que deu notícia, a companheira da família atestou: «agora o menino já pode copiar desses livros e escrever outro melhor».

Horas depois, Guilherme d’Oliveira Martins, orador da tradicional Conferência de Abertura, intitulou-a “Quem tem medo da Cultura?”, citando a peça teatral de Edward Albee – como aludiu durante a intervenção – e usando a frase para deambular sobre a importância da solidez de uma Política Cultural, o que subentende uma concepção sem medo de articular criatividade, sustentabilidade e lucidez na utilização dos recursos, o que também deixou expresso. Como fazê-lo? Essa talvez seja a MDQ (Million Dollar Question; para universalizar ainda mais, em terreno anglo-saxónico). E a Língua Portuguesa é manuseada por 270 Milhões de falantes em todo o mundo, como o Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, Aires Pereira, aludiu pela manhã.

Regressemos à conversa entre a Leonor e o Rui. Por aqui, vale a pena usar este tratamento, informal, de proximidade, o que nos concede Liberdade mas, simultaneamente, responsabilidade, como é na vida em geral, e nos afectos em particular.

Leonor compara os tempos mortos, esperando o tratamento, no IPO, às putas num bordel, enquanto não são chamadas para entregar o corpo (“…umas olham para o telemóvel, outras vêem televisão sem som, outras olham para o ar…”).

É por estas e por outras que a frase da Guilhermina Gomes é simples e importante, alimentando cada Xerazade que ganha o próximo dia e todos os outros. Continua a escrever… continua… continua…