Moderada por Carlos Vaz Marques e tendo como ponto de partida o verso de Luís Quintais “Eu começo depois da escrita”, esta mesa terminou com confissões, narrações, poemas, realidade e ficção.

Ignacio del Valle falou sobre o seu conceito de literatura e sobre o processo de escrita confessando “gosto muito de escrever, de publicar e de vender livros”. Para o escritor que faz parte da geração de novos e talentosos escritores espanhóis, “a literatura é mutante, não tem princípio nem fim”. Ignacio del Valle afirmou que “a narrativa não é só uma história, tem também uma linguagem” e referiu-se à “Santíssima Trindade da narrativa: estrutura, argumento e linguagem”.

Para João Paulo Cuenca, “narrar, mais do que escrever, define o que é humano” enquanto que “escrever é a coisa mais anti-natural e artificial que existe” e, neste sentido, acrescentou, “o escritor só tem experiências reais durante a infância porque a partir do momento em que começa a escrever, começa a representar”. E a propósito deste simulacro que é a narração, o escritor carioca falou do seu livro O único final feliz para uma história de amor é um acidente, que tem dois narradores, uma boneca e um velho chinês, sendo que a boneca é a “metáfora para o simulacro da literatura em si, ela começa enquanto se escreve, auto-narra-se”.

Júlio Conrado confessou que ao confrontar-se com o tema da mesa “não sabia bem como descalçar este par de botas e convoquei os meus heterónimos para um plenário, puxei pela imaginação e saiu um poema acróstico a partir do verso «Eu começo depois da escrita»”. E em resposta ao repto e em homenagem a Luís Quintais, Júlio Conrado leu o poema que escreveu e terminava dizendo “começo a corrigir-me depois da escrita”.

Karla Suarez referiu-se ao facto de através da escrita o escritor poder ser outra pessoa e começou por contar que quando era criança pensava que queria ser actriz para poder viver outras vidas. Mas descobriu que através da escrita este processo de criação poderia ser mais interessante porque “qualquer personagem podia ser eu”. Karla Suarez revelou ainda que a escrita tem em si o “poder de desnudar-me sem tirar a roupa” e “escrever é um bom remédio”.

Para Maria João Martins, “tudo é literatura e até os meus sonhos são literatura. Eu não existo depois da escrita mas a escrita como ferramenta reinventou-me”. E a este propósito, a jornalista revelou que em criança era muito exasperada mas a “exasperação apaziguou-se a partir do momento em que comecei a escrever”. Maria João Martins falou do seu livro, Como o ar que respiras, em que refere o poder das palavras no desencadear de uma história de amor. Foi através de um verso de Elizabeth Browning, poetisa vitoriana do século XIX, que tudo começou, ou seja “não só existiu depois da escrita como também existiu através da escrita”.

Miguel Miranda revelou que “escrever é uma espécie de maquinação, um processo e a escrita uma espécie de quiromancia sendo o escritor um aprendiz de quiromante”. E sobre a arte de escrever, Miguel Miranda afirmou que “escrevo porque escrevo assim como respiro” e fá-lo com “intenso prazer”, “escrever é uma espécie de fuga para perdurar e escrevendo atinjo a eternidade ou sou atingido por ela”. E sobre a perenidade, o escritor referiu que se trata de “ubiquidade mental do escritor” a certeza de obter eternidade através da escrita. “A escrita é uma corrente, corre e amarra num mesmo acto”, assim explica que depois da escrita começa a escrever de novo. O escritor é “psicótico intermitente” porque “no momento mágico em que acabo o livro, há um misto de prazer e alívio que depressa se transforma em angústia e estes instantes finais são vertiginosos e surge um silêncio insuportável”.

Acompanhe todos os momentos do 12º Correntes d’Escritas no portal municipal.