Alberto Serra foi o
moderador de uma discussão que teve início com a intervenção do poeta, narrador
e ensaísta Ramiro Fonte. “Os deuses estão ausentes do território da poesia
moderna”, começou por dizer o autor espanhol, que afirmou ainda que “a grande
poesia ainda tem saudades dos deuses”. No entanto, Ramiro Fonte reconheceu que,
ainda que haja a ausência dos deuses, a poesia “se vai alimentando de novos
mitos”, dando o exemplo de Marilyn Monroe, figura carismática do séc. XX.

A discussão
continuou, desta feita pela voz de Nuno Rebocho. O divino ou o não-divino da
poesia assim como a relação desta com os segredos marcou o seu discurso,
levando-o mesmo a afirmar que talvez na poesia se encontre “não o carácter
divino, mas o carácter demoníaco”. No entanto, acabou por concluir que a poesia
é feita pelos homens, logo é um acto profundamente humano e não divino. E
quanto à questão do segredo dos deuses, Nuno Rebocho foi peremptório: “A poesia
é um acto de falar alto. Não posso conceber a poesia como um segredo”.

Para Carlos Quiroga,
o interveniente que se seguiu, a questão coloca-se de uma outra forma: “São os
poetas os deuses, logo os detentores do segredo?”. “Estamos carregados de
enigma”, acabou por dizer durante a sua intervenção, acabando por comparar a
condição de poeta a um esgrimista que, tocando com a espada no corpo do
adversário, se acende uma luz. Na opinião do professor de literatura e também
autor de várias obras, também o poeta tem “uma capacidade olímpica de tocar nos
sensores das almas”.

A mesa fechou com a intervenção de António
Cícero, poeta e ensaísta brasileiro. “Não penso que a poesia seja um segredo
dos deuses”, começou por dizer, “não porque tenho alguma coisa contra os
deuses”. De facto, para este autor brasileiro, as musas são os deuses que os
poetas evocam “e se alguém sabe algum segredo são elas”. À semelhança da
opinião de Nuno Rebocho, também António Cícero vê a poesia como um fenómeno
humano, recheado de características e sentimentos que os deuses não entendem
“porque se encontram longe deles”.

“A poesia é um segredo dos deuses?” foi a
questão que ficou ainda no ar. No entanto, as mesas de debate continuam,
debatendo diferentes temas, mas sempre sem perder de vista a Literatura, tema
central do Correntes d’Escritas.