Renato Filipe Cardoso não podia ter sido mais assertivo, quando evocou um dos mais célebres versos de Natália Correia para dar o mote à sua intervenção, com tanto de Literatura como de Performance: «Ó subalimentados do sonho!/ A poesia é para comer».

A mesa matinal do último das Correntes d’escritas deste ano (“Da vida restam memórias, vazio, literatura”) encerrou com um alguidar em cima da mesa. Lá foram sendo colocados ingredientes vários, como um pedaço de vazio (carne); um exemplo de crítica literária; uma revista pornográfica ou poemas vários (do próprio autor e de outros comparsas, como Mário Cesariny de Vasconcelos, a brasileira Hilda Hilst ou a polaca Wisława Szymborska).

É bom entender como este tipo de eventos potencia a imaginação e convidada a incluir a palavra escrita, ou lida, em roupagens mais abrangentes que a sublinham e enriquecem.

É bom entender como, cada vez mais, festivais e outros encontros desta natureza podem – e devem – acolher diferentes formas de expressão. Quem fica a ganhar é o público.

É bom entender como o humor; a crítica social; a reflexão filosófica; a deambulação poética; a Memória literária; a evocação das figuras tutelares protagonistas de roturas epistemológicas que perduram; os afectos pessoais (redundante expressão – como se houvesse outros); a ampliação de públicos conhecedores daquilo a que assistem; o apelo a diferentes gerações para uma partilha, fruição e discussão de Pensamento; a noção do lúdico nas Artes… é bom entender como tudo isto está permanentemente em palco num evento com as caraterísticas das Correntes d’Escritas.

Uma espécie de dieta rica em condimentos e nutrientes, sem contraindicações, apaladada pela mestria de quem cozinha, emprata e serve tamanho acepipe.