Isto porque à 10ª edição do Correntes d’Escritas, efeméride que é comemorada com um programa à altura, se juntam estes dias solarengos e amenos, como que a dar as boas-vindas aos cerca de 130 escritores de todo o mundo ibérico que participam no Encontro.

Seis desses participantes apresentaram ontem seis livros da sua autoria, no Novotel Vermar, a que se seguiu uma sessão de poesia.

A editora Trinta por uma Linha, dedicada exclusivamente à literatura infanto-juvenil, apresentou dois livros, Meu Fito, Meu Feito, de Vergílio Alberto Vieira, e O Sonho do Elefante Tomé, de Amadeu Baptista. Se para Vergílio Alberto Vieira este é já o seu 21º título infantil, para Amadeu Baptista é o segundo. Em comum, ambos os autores têm o factor de se terem dedicado à escrita infantil tardiamente, “depois de uma actividade poética de mais de 25 anos”, explicou Amadeu Baptista. Vergílio Alberto Vieira, que se sente “profundamente compensado” por esta dedicação à escrita para os mais novos, foi também quem convenceu Amadeu a enveredar por este tipo de literatura.

Da literatura infanto-juvenil viajou-se até Cuba, pela escrita de Leonardo Padura que apresentou Um Passado Perfeito. Cármen Serrano, da editora Asa, explicou que este livro é “o primeiro volume de uma tetrologia que a Asa encerra, ‘As 4 Estações’, e é um retrato vívido de uma Cuba que não é a frequente dar-se conhecer.” Uma Cuba de esperança e ilusão, que faz “uma gestão do dia-a-dia que está longe do que nos trazem os folhetos turísticos.” O autor cubano, que com humor referiu que a edição destes quatros livros não seguiu uma ordem cronológica, acrescentou que em Um Passado Perfeito, romance policial, se assiste ao nascimento daquele que viria a ser uma personagem marcante da obra de Padura, Mário Conde. “É o sétimo livro que publico em Portugal”, afirmou, considerando “muito satisfatório estar cá, a participar neste maravilhoso festival que é muito peculiar, que permite o contacto entre escritores e público.”

Ivo Machado é já presença assídua do Correntes d’Escritas. Participa desde a primeira edição e ontem lançou Tamujal, um livro de poemas e de coincidências. “Tamujal são dez poemas escritos em dez dias, que apresento nestes dez anos de Correntes, no dia dez às dez horas.” Agradecendo ao editor da Exodus “por ter arriscado publicar um livrinho com dez poemas” o escritor açoriano desvendou que Tamujal “é um lugar próximo do lugar onde eu nasci e que eu descobri perto dos meus 50 anos.” Lêdo Ivo, a quem o autor agradeceu e um dos participantes na edição deste ano do Correntes d’Escritas, escreveu o prefácio desta obra. Presente estava também Rui Machado, irmão de Ivo, que lançou Mergulho, com a chancela da Portugália. E não deixou de fazer referência a essa relação de sangue que o une a Ivo Machado, dizendo mesmo que “se os nossos pais pudessem estar aqui, iriam ficar muito orgulhosos”. E este ponto serviu para Rui Machado fazer uma analogia entre um filho e um livro. “Uma das coisas que dizem é que os livros são como os filhos, algo que por um lado considero falso, e por outro verdadeiro.” Falso porque, como explicou, duvida que qualquer pai gostasse de ver passar o seu filho “de mãos em mãos, como se passa um livro.” Verdadeiro porque um livro “é um acto de amor”. E tal como um pai, o autor pediu para o seu livro. “Gostaria que se aproximassem dele, que o compreendessem.” Mergulho é, nas palavras de José Ribeiro, o editor, um livro que está “na fronteira dos géneros – é romance, é ficção narrativa, é prosa poética”. Rui Machado é autor de outros três livros, de poesia.

Privado, um título que em si parece fechado, inacessível, foi afinal motivo para umas boas gargalhadas durante a sua apresentação. Fernando Esteves Pinto, autor, explicou que este foi lançado pela editora Canto Escuro “que é afinal onde estão as editoras independentes”, gracejou. “Tem uma capa atraente, é capaz de vender, da autoria de Manuel Almeida, que fez também a contracapa mas que já não soube fazer a lombada.” Ironizando ainda sobre as mudanças físicas que sofreu durante o período de escrita do livro, Fernando Esteves Pinto explicou que Privado nasceu de um blog que mantinha e para onde as pessoas foram enviando as suas histórias. “São pequenas histórias conjugais com uma vertente de sexualidade e psicológica.” E para o fim, deixou um pedido “não tenham pudor em comprar um livro sobre sexo, porque afinal toda a gente alinha.”

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E foi sob este manto de bom humor que se assistiu à sessão de poesia que contou com as participações de Lêdo Ivo, Juan Carlos Mestre, António Ferra, Amadeu Baptista e Bruno Serrano. Amante da literatura de Eça de Queirós e Camilo Castelo Branco, Lêdo Ivo, que voltou à Póvoa após uma visita que decorreu à mais de 20 anos, recitou “Minha Pátria”, “A Neve e o Amor” e o humorado “O Rato da Sacristia”. Já Juan Carlos Mestre repetiu a brilhante homenagem que no ano passado fez a Lêdo Ivo, juntando poesia e música no recital de “Cavalo Morto”, abrilhantada pela presença do autor brasileiro entre a assistência. E como diz o poema que recitou “Cavalo Morto é um lugar que existe num poema de Lêdo Ivo”, e quando esse cavalo morrer “chama-se Lêdo Ivo para que o ressuscite.”

António Ferra recitou “Entre Contentores de Lixo”, “A Cidade Sitiada” e “Orquestração de um Poema Ilegível”, do seu recente livro Estação Suspensa. Também Amadeu Baptista optou por ler um poema da sua autoria, o “Poema 20” de Os Selos da Lituânia. Bruno Serrano, autor chileno, fez questão de partilhar o seu poema primeiro em espanhol, depois em português. Isto porque, tendo trabalhado com comunidades indígenas, foi alertado para o facto de os indígenas aprenderam a falar espanhol, para compreender o pensamento dos seus interlocutores. Mas estes nunca tentaram aprender a língua dos indígenas “e não compreendendo a língua, não se chega ao pensamento”, explicou. E assim, a plateia ouviu “Esta noite”, retirado de Fértil Província i Desterrada, livro que será apresentado no dia 13.

O Correntes d’Escritas arranca hoje oficialmente, com a Sessão de Abertura, marcada para as 11h00, no Museu Municipal. Recorde-se que este é o momento em que são conhecidos os vencedores dos Prémios Literários Casino da Póvoa, Correntes d’Escritas/Papelaria Locus e Conto Infantil Ilustrado Correntes d’Escritas/Porto Editora.

Acompanhe todo o evento no portal municipal.